sexta-feira, 9 de julho de 2010

Romanos, Cap. 4, Waggoner

CARTA AOS ROMANOS, Por Ellet J. Waggoner, Um dos dois mensageiros de 1888
Tradução e Edição César L. Pagani


Capítulo 4

Crendo na Maravilhosa Promessa de Deus
O objetivo precípuo de estudar pormenorizadamente qualquer livro da Bíblia é captar em seu conjunto a idéia principal que contém. O segundo capítulo de Romanos e a primeira parte do terceiro nos permitiram entender que todos os homens estão na mesma deplorável condição. Contemplamos o aspecto luminoso na última parte do terceiro capítulo. Aí se estabelece a gratuidade da graça de Deus em Cristo, como Salvador dos pecadores. E agora, no quarto capítulo, encontramos o argumento central em relação à justificação pela fé.

A Bênção de Abraão – Romanos 4:1-12
1 Que, pois, diremos ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne?
2 Porque, se Abraão foi justificado por obras, tem de que se gloriar, porém não diante de Deus.
3 Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça.
4 Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida.
5 Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça.
6 E é assim também que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras:
7 Bem aventurados aqueles cujas iniqüidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos;
8 bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado.
9 Vem, pois, esta bem-aventurança exclusivamente sobre os circuncisos ou também sobre os incircuncisos? Visto que dizemos: a fé foi imputada a Abraão para justiça.
10 Como, pois, lhe foi atribuída? Estando ele já circuncidado ou ainda incircunciso? Não no regime da circuncisão, e sim quando incircunciso.
11 E recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé que teve quando ainda incircunciso; para vir a ser o pai de todos os que crêem, embora não circuncidados, a fim de que lhes fosse imputada a justiça,
12 e pai da circuncisão, isto é, daqueles que não são apenas circuncisos, mas também andam nas pisadas da fé que teve Abraão, nosso pai, antes de ser circuncidado.

“Segundo a carne”: –Abraão não era o pai ou antecessor, segundo a carne, de todos aqueles a quem Paulo dirigia sua epístola. O tema proposto é a justificação pela fé. Agora se pode demonstrar que o próprio Abraão não recebeu a justiça segundo a carne, senão somente pela fé. Daí tudo fica mais claro.
Ninguém se glorie – Se no plano da salvação houvesse lugar para coisa tal como a justiça pelas obras, então haveria terreno propício para a vanglória. Se alguém pudesse ser salvo pelas obras, então poderiam assim ser salvos todos os homens; nesse caso, os que fossem salvos poderiam orgulhar-se de sua superioridade sobre o restante que se encontra em circunstâncias similares. Porém, temos visto que a vanglória está excluída. “Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são; a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus”. (I Coríntios 1:27-29)
Gloriar-se “em” ou gloriar-se “perante”: –Se Abraão houvesse sido justificado pelas obras, teria motivos para gloriar-se, porém, o fato é que não pôde jactar-se diante de Deus, como provam as palavras “Abraão creu em Deus e isso foi-lhe imputado por justiça”. Para que o homem pudesse ser justificado pelas obras, seria preciso demonstrar que não havia cometido nenhum mal. Nessa condição não haveria necessidade de fé; as obras falariam por si mesmas. Porém Abraão foi justificado pela fé e está claro que não foi por obra alguma. Aquele que é justificado tão-somente pelas obras de Deus se gloriará unicamente nas obras d’Ele. Isso é gloriar-se em Deus, o que é oposto a gloriar-se perante Deus.

Paulo e Tiago: –É neste ponto que quase todos citam as palavras de Tiago: “Não foi por obras que Abraão, o nosso pai, foi justificado, quando ofereceu sobre o altar o próprio filho, Isaque?” (Tiago 2:21) Desgraçadamente, o texto é costumeiramente empregado como se pudesse desvalorizar as palavras de Paulo. Parece dar-se como definitivo que existe contradição entre Paulo e Tiago, e a simpatia se inclina de forma natural para o que Tiago ensina. Alguns crêem que Tiago escreveu com o propósito de corrigir “posições extremistas” de Paulo sobre a justificação pela fé.
Faremos bem em descartar todas essas idéias tolas e ímpias. Ninguém pode chegar a uma compreensão proveitosa das Escrituras, a menos que se empenhe em seu estudo com a convicção de que “toda Escritura é inspirada por Deus”. O Espírito Santo não inspira, em nenhum caso, palavras que necessitem ser posteriormente corrigidas.

A fé que opera: –O problema de quem lê desse modo as palavras de Tiago é que supõe que o apóstolo pretende dizer que Abraão foi justificado por suas próprias obras de fé. “Vês como a fé operava juntamente com as suas obras?” Esse é o selo perene da fé viva, tal como mostra o apóstolo, em perfeita concordância com a declaração de Paulo. O último versículo do terceiro capítulo de Romanos nos diz que mediante a fé estabelecemos a lei.
O mesmo termo “justificação” mostra que essa fé cumpre os reclamos da lei. A fé faz do homem um cumpridor da lei, já que esse é o significado da expressão “justificação pela fé”. Assim, em sua epístola, Tiago nos informa que as obras de Abraão demonstraram a perfeição de sua fé. “Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça”. (Romanos 4:3) O apóstolo Tiago ensina, portanto, o mesmo tipo de justificação de Paulo. Caso contrário, um ou outro, se não ambos, ficariam desacreditados como apóstolos. A única classe de justificação que a Bíblia reconhece é a justificação pela fé que opera.

Dívida e favor: –“Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida”. É importante ter-se presente o propósito do quanto aqui escrito por Paulo. O tema é a maneira pela qual o homem é justificado Se alguém pudesse operar sua própria justificação, a recompensa – a justiça – não seria um dom ou favor, mas o pagamento de uma dívida. Isso supondo que pudesse existir alguma justiça pelas obras. Em tal caso, o homem iria a Deus para reclamar o que lhe é devido.
Porém, nenhum homem pode impor a Deus essa obrigação. “Ou quem primeiro deu a Ele para que lhe venha a ser restituído”. (Rom. 11:35). Se alguém pudesse fazer algo pelo Senhor, de maneira que Ele Se obrigasse perante o homem, então todas as coisas não procederiam d’Ele. Dito de outra maneira, a justificação pelas obras se opõe ao fato de que Deus e o Criador de todas as coisas. E vice-versa, o reconhecimento de Deus como Criador é a consideração de que somente d’Ele procede a justiça.

Justificando o ímpio: –Deus justifica o ímpio. Somente o ímpio está necessitado de justificação. Porém, veja bem que Deus não justifica a impiedade. Isso seria chamar bom ao que é mau e negar-Se a Si mesmo. Pelo contrário, o que Ele faz é justificar ou tornar justo ao ímpio, que é precisamente o que esse necessita. Deus justifica o pecador que crê, tornando-o um novo homem em Jesus Cristo; pode fazer isso e continuar sendo justo. O homem não é justificado pelas obras, porém o homem justo age, embora sempre o faça pela fé. “O justo viverá da fé”. É a fé que o faz continuar vivendo em justiça. A realidade das obras da fé é mais manifesta na última parte deste capítulo.

Descrição da bem-aventurança: –A bem-aventurança do homem a quem Deus imputa justiça sem as obras, é a do perdão dos pecados e da libertação do poder do pecado. Deus não imputará pecado a quem vive pela fé em Cristo, de modo que as obras de Jesus sejam suas próprias. “Ora, como recebestes Cristo Jesus, o Senhor, assim andai n’Ele... porquanto, n’Ele, habita, corporalmente, toda a plenitude da Divindade... Também, n’Ele, estais aperfeiçoados”. (Colossenses 2:6-10).

Bênçãos para o judeu e o gentio: –A bênção alcança por igual à circuncisão e a incircuncisão. Encontramos aqui a repetição da verdade estabelecida no terceiro capítulo, referente ao fato de que não há diferença no que tange à justificação. Abraão é o pai da nação judaica segundo a carne, porém a bênção que recebeu foi quando ainda era incircunciso como qualquer outro gentio. Por isso, pode ser pai de ambos, judeus e gentios. Recebeu sua bênção pela fé, de forma que “os que são da fé são benditos como o crente Abraão”. (Gálatas 3:9).

Como recebemos a bênção? –Já vimos anteriormente que a bênção veio a Abraão mediante Cristo. O apóstolo Paulo nos diz que “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se Ele próprio maldição em nosso lugar (porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro) para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido”. (Gálatas 3:13 e 14). Tudo quando foi prometido a Abraão estava contido na bênção descrita por Davi. Deus enviou Seu Filho para nos abençoar, fazendo com que nos convertamos de nossa maldade (Atos 3:26). É a cruz de Cristo que transfere as bênçãos de Abraão para nós. As bênçãos são, pois, espirituais. Nenhuma das bênçãos prometidas a Abraão era meramente temporal. Isso da evidência de que a herança prometida a Abraão e sua semente refere-se unicamente aos que são filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo.

A circuncisão nada é: –A vantagem dos que são da circuncisão é que a eles foram confiados os oráculos de Deus; porém isso não lhes adveio mediante a circuncisão. A circuncisão era somente um sinal, e não meritória em si mesma. Foi dada a Abraão como uma prova da justiça pela fé que ele já possuía. E tampouco pode significar coisa alguma para nenhum outro. Se alguém dos que estavam circuncidados não possuía a justiça, então sua circuncisão nada significava. “A circuncisão, em si, não é nada; a incircuncisão também nada é, mas o que vale é guardar as ordenanças de Deus”. (I Coríntios 7:19). Assim Abraão era o pai dos circuncidados sob condição de que não tivessem apenas um mero sinal exterior, mas a justiça pela fé, que é verdadeiramente necessária.
Tudo em Cristo – Referindo-se a Jesus, disse o apóstolo: “Porque quantas são as promessas de Deus, tantas têm n’Ele o sim; porquanto também por Ele é o amém para glória de Deus, por nosso intermédio”. (II Coríntios 1:20) Não há promessa divina a homem algum que não seja em Cristo”.

A Herança e os Herdeiros – Romanos 4:13-15.
“13 Não foi por intermédio da lei que a Abraão ou a sua descendência coube a promessa de ser herdeiro do mundo, e sim mediante a justiça da fé.
14 Pois, se os da lei é que são os herdeiros, anula-se a fé e cancela-se a promessa,
15 porque a lei suscita a ira; mas onde não há lei, também não há transgressão”.

Onde está a promessa?: –Uma pergunta bastante natural ao lermos o décimo terceiro versículo seria. Onde vemos uma promessa de que Abraão e sua semente deveriam ser herdeiros do mundo? Muitos crêem que o Antigo Testamento não contém tal promessa. Porém, não pode existir qualquer dúvida quanto a isso, já que o apóstolo diz que ela existe. Se não a achamos é por havermos lido demasiado superficialmente o Antigo Testamento, ou com mentes condicionadas por opiniões preconcebidas. Se prestarmos atenção nas relações estabelecidas por Paulo, não teremos dificuldade em localizar a promessa.
Sobre que temas relacionados está aqui falando o apóstolo? De uma herança mediante a justiça pela fé, e também do fato de que a circuncisão foi dada a Abraão como sinal da justiça que tinha pela fé; portanto, como sinal da herança que receberia mediante ela.
Em que lugar do Antigo Testamos encontramos o relato da introdução da circuncisão, e de uma promessa dada em relação a ela? No capítulo 17 de Gênesis. Esse é um bom lugar para buscar a promessa segundo a qual Abraão seria herdeiro do mundo. Leiamo-la:
“Estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência no decurso das suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e da tua descendência. Dar-te-ei e à tua descendência a terra das tuas peregrinações, toda a terra de Canaã, em possessão perpétua, e serei o seu Deus. Disse mais Deus a Abraão: Guardarás a minha aliança, tu e a tua descendência no decurso das suas gerações”.
Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado. Circuncidareis a carne do vosso prepúcio; será isso por sinal de aliança entre mim e vós”. (Gênesis 17:7-11).
Quem sabe você diga a si mesmo: “Sim, é claro que aí existe uma promessa, porém o que estamos procurando é a promessa de que Abraão e sua semente herdariam a Terra, e não encontro tal passagem. Todo o que vejo é uma promessa de que herdariam a terra de Canaã”.
Porém, vamos por outro caminho e logo veremos que essa é realmente a promessa de que Abraão e sua semente seriam herdeiros do mundo. Temos que analisar os detalhes da promessa. E primeiramente devemos notar o fato de que a herança prometida é eterna.
Abraão mesmo deveria recebê-la como uma possessão eterna. Porém, a única forma em que ambos – Abraão e sua semente – poderiam ter a posse eterna de uma herança é recebendo eles mesmo a vida eterna. Vemos, por conseguinte, que nessa promessa feita a Abraão temos a segurança da vida eterna com a qual fruiremos a possessão. Todavia, isso se faz mais evidente ao considerarmos que a herança é de justiça. “Não foi por intermédio da lei que a Abraão ou a sua descendência coube a promessa de ser herdeiro do mundo, e sim mediante a justiça da fé”. (Rom. 4:13) Isso coincide precisamente com a promessa do capítulo dezessete de Gênesis, uma vez que esse pacto foi selado mediante a circuncisão (versículo 11 de Gênesis 17), e segundo Romanos 4:11, a circuncisão era o selo da justificação pela fé.
Alguém pode dizer que isso não é algo evidente no Antigo Testamento, de modo que não se pode supor que os judeus assim o entendessem. Hoje dispomos do Novo Testamento, que lança mais luz sobre o fato. É certo que no estudo do Antigo Testamento devemos muito ao Novo, porém, não há nesse nenhuma revelação nova. Somente a partir do Antigo Testamento é possível compreender que a herança prometida a Abraão e sua semente, o foi somente sob a condição da justiça pela fé.
Essa é a conclusão lógica a partir do fato de que a herança constituía uma posse eterna. Os judeus sabiam muito bem que a vida eterna pertence somente aos justos. “O justo jamais será abalado, mas os perversos não habitarão a Terra”. (Provérbios 10:30) “Porque os malfeitores serão exterminados, mas os que esperam no Senhor possuirão a Terra”. (Salmo 37:9). “Aqueles a quem o Senhor abençoa possuirão a terra; e serão exterminados aqueles a quem amaldiçoa”. (verso 22)

O quinto mandamento diz: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor, teu Deus, te dá”. A observância dos mandamentos nunca significou uma diferença entre no prolongamento da vida do homem neste mundo (Nota: Exceção feita ao incremento da longevidade por parte de quem obedece às leis naturais sobre saúde). Contudo, a herança que Deus prometeu a Abraão será eterna em função da justiça de seus possuidores.

A promessa e a ressurreição: –Se lermos atentamente, veremos outro detalhe na promessa registrada em Gênesis. A promessa foi feita a Abraão e à sua semente. Estevão citou como fato bem conhecido que Abraão não recebeu sequer a porção de terra prometida que lhe permitisse assentar um dos pés (Atos 7:5). Podemos encontrar isso no Antigo Testamento, já que nos é dito ali que teve ele de comprar o terreno dos cananeus, que haveriam de ser expulsos, segundo a promessa de Deus – um lote de terra onde pudesse sepultar sua esposa. E quanto a seus descendentes, sabemos que tiveram de morar em tendas, errantes de um lugar a outro. O próprio Jacó morreu na terra do Egito. E ainda mais. Lemos as palavras de Davi, cujo reino se encontrava na hora de maior prosperidade para os filhos de Israel na terra de Canaã: “Ouve, Senhor, a minha oração, escuta-me quando grito por socorro; não Te emudeças à vista de minhas lágrimas, porque sou forasteiro à Tua presença, peregrino como todos os meus pais o foram”. (Sal. 39:12). Na oração de consagração dos dons do templo, por ocasião da coroação de Salomão, vemo-lo expressando-se em termos similares (I Crônicas 29:15).
Ademais, e mesmo mais importante, temos as palavras de Deus a Abraão ao fazer-lhe a promessa. Depois de haver assegurado que daria a terra de Canaã a ele e sua semente, o Senhor lhe disse que sua semente haveria de ser, primeiramente, escrava em terra estrangeira. “E tu irás para os teus pais em paz; serás sepultado em ditosa velhice.
Na quarta geração, tornarão para aqui...” (Gênesis 15:15 e 16). Sabemos, pois, que foi dito claramente a Abraão que ele morreria antes de receber qualquer herança na Terra, e que se passariam pelo menos quatrocentos anos antes que sua semente pudesse herdá-la.
Porém, Abraão morreu na fé e também sua semente. Diz Hebreus 11:13: “Todos estes morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudando-as, e confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a Terra”. Morreram na fé, posto que sabiam que Deus não pode mentir. Contudo, visto que a promessa de Deus deve cumprir-se e que eles não receberam nesta vida a herdade prometida, a conclusão inquestionável é que somente se pode obter mediante a ressurreição dos mortos.
Essa era a esperança que susteve os israelitas fiéis. Abraão foi fiel em oferecer Isaque sobre o altar, devido à sua fé no poder de Deus de ressuscitar mortos. Quando Paulo estava preso em razão da “esperança e a ressurreição dos mortos”. (Atos 23:6), disse: “E, agora, estou sendo julgado por causa da esperança da promessa que por Deus foi feita a nossos pais, a qual as nossas doze tribos, servindo a Deus fervorosamente de noite e de dia, almejam alcançar...” E então, para mostrar a razoabilidade dessa esperança, perguntou ao rei Agripa: “Por que se julga incrível entre vós que Deus ressuscite os mortos?” (Atos 26:6-8).
A ressurreição de Jesus Cristo é o compromisso e a garantia da ressurreição daqueles que crêem n’Ele. (Ver I Coríntios 15:13-20). Os apóstolos anunciaram “em Jesus, a ressurreição dentre os mortos” (Atos 4:2). E um deles disse, para nosso benefício: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita misericórdia, nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos céus para vós outros que sois guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação preparada para revelar-se no último tempo.” (I Pedro 1:3-5)
Logo acrescenta que essa fé se submete à prova, a fim de que “redunde em louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo”. E isso nos leva à conclusão do assunto, de que a promessa feita a Abraão e à sua semente de que seriam herdeiros do mundo, é a promessa da vinda de Cristo.
O apóstolo Pedro diz que é necessário recordarmos as palavras dos santos profetas, porque “nos últimos dias, virão escarnecedores com os seus escárnios, andando segundo as próprias paixões e dizendo: Onde está a promessa da sua vinda? Porque, desde que os pais dormiram, todas as coisas permanecem como desde o princípio da criação”. (II Pedro 3:3 e 4) Isto é, não crêem na promessa
Porém, eles não raciocinam corretamente, já que “... deliberadamente, se esquecem que, de longo tempo, houve céus bem como terra, a qual surgiu da água e através da água pela palavra de Deus, pela qual veio a perecer o mundo daquele tempo, afogado em água. Ora, os céus que agora existem e a terra, pela mesma palavra, têm sido entesourados para fogo, estando reservados para o Dia do Juízo e destruição dos homens ímpios”. (II Pedro 3:5-7).
Veja que a promessa não somente tem algo a ver com os pais, mas que também afeta toda a Terra. Os escarnecedores afirmam que desde que os pais dormiram, todas as coisas continuam como eram desde o princípio da criação. Porém, o apóstolo replica que ao pretenderem tal coisa, estão fechando os olhos ao fato de que a mesma palavra que no princípio fez os céus e a Terra, destruiu também a Terra através do dilúvio. De igual maneira, a Terra está agora preservada pela mesma palavra, até o dia do juízo e da perdição dos ímpios, quando será destruída pelo fogo. Todavia nós, “segundo a Sua promessa, esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita justiça”. (II Pedro 3:13).
Segundo que promessa?: –A promessa feita aos pais, de que Abraão e sua semente herdariam a Terra. De acordo com os cômputos humanos, já passou muito tempo desde que a promessa foi feita, porém, “não retarda o Senhor a Sua promessa...” Não se passou tanto tempo desde que Ele a fez, como se a houvesse esquecido, já que para o Senhor “um dia é como mil anos, e mil anos, como um dia”. A razão por que é esperada por tanto tempo é que Ele não quer que ninguém se perca, mas que todos cheguem ao arrependimento.
Assim vemos que temos nessa promessa um interesse tão grande como o que o próprio Abraão teria. Ela ainda está em vigência, aberta à aceitação de todos. Abarca toda a vida eterna de justiça na Terra renovada, tal como era no princípio. A esperança da promessa de Deus aos pais era a esperança da vinda do Senhor para ressuscitar os mortos, concedendo assim a herança.
Cristo esteve aqui na Terra. Naquela ocasião Ele não tinha mais herança do que Abraão possuiu. Não tinha nem mesmo onde recostar a cabeça. Deus está agora enviando Seu Espírito Santo a fim de selar os crentes para a herança, o mesmo que fez com Abraão. Quando todos os fiéis forem selados assim, enviará Ele “o Cristo, que já vos foi designado, Jesus, ao qual é necessário que o Céu receba até aos tempos da restauração de todas as coisas, de que Deus falou por boca dos Seus santos profetas desde a antiguidade”. (Atos 3:20 e 21).
Vimos o que Abraão descobriu e de que maneira o descobriu. Vimos também o que Deus nos prometeu, como o fez a Abraão, se crermos em Sua Palavra. Deus prometeu a todo aquele que n’Ele crê nada menos que libertação do mundo. Não se trata de algo arbitrário. Não é que Deus nos disse que se crermos em certas declarações e dogmas, Ele nos concederá em troca a herança eterna. Essa herança é um legado de justiça, e posto que a fé significa receber a vida de Cristo no coração, juntamente com Sua justiça, é evidente que não há outra maneira de receber a herança. Isso se faz mais evidente ao prestarmos atenção a certa expressão do verso 15, que antes não havíamos considerado: “a lei opera a ira”.
Aquele que crê poder obter a justiça a partir da lei está pondo sua confiança naquilo que o destruirá. Deus prometeu uma terra em herança a todo que a aceite em suas devidas condições, isto é, que aceita a justiça que vem com ela, uma vez que dita justiça é precisamente a característica da terra. “... Novos céus e nova terra, nos quais habita justiça”. Porém, essa justiça pode ser encontrada unicamente na vida de Deus manifestada em Cristo.
Aquele que pensa que pode, por si mesmo, obter justiça a partir da lei, em realidade está tentando substituir a justiça de Deus pela sua própria. Está tratando de conseguir a terra de forma fraudulenta. Portanto, quando comparecer ante o tribunal do juízo para reclamar seus direitos de propriedade sobre a terra, descobre que há uma acusação criminal contra ele e encontra “ira” em lugar de bênção. “Onde não há lei, também não há transgressão”. Porém, a lei está em todo lugar e também a transgressão. Todos pecaram; assim, a herança não pode ser obtida pela lei.

A Grande Satisfação de Crer na Promessa. Romanos 4:16-25.
16 Essa é a razão por que provém da fé, para que seja segundo a graça, a fim de que seja firme a promessa para toda a descendência, não somente ao que está no regime da lei, mas também ao que é da fé que teve Abraão (porque Abraão é pai de todos nós,
17 como está escrito: Por pai de muitas nações te constituí.), perante aquele no qual creu, o Deus que vivifica os mortos e chama à existência as coisas que não existem.
18 Abraão, esperando contra a esperança, creu, para vir a ser pai de muitas nações, segundo lhe fora dito: Assim será a tua descendência.
19 E, sem enfraquecer na fé, embora levasse em conta o seu próprio corpo amortecido, sendo já de cem anos, e a idade avançada de Sara,
20 não duvidou, por incredulidade, da promessa de Deus; mas, pela fé, se fortaleceu, dando glória a Deus,
21 estando plenamente convicto de que ele era poderoso para cumprir o que prometera.
22 Pelo que isso lhe foi também imputado para justiça.
23 E não somente por causa dele está escrito que lhe foi levado em conta,
24 mas também por nossa causa, posto que a nós igualmente nos será imputado, a saber, a nós que cremos naquele que ressuscitou dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor,
25 o qual foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação.

“Seja firme a promessa para toda a descendência”: –Visto que a herança é mediante a justiça pela fé, resulta igualmente segura para toda a semente e ao alcance de todos. A fé concede a todos a mesma oportunidade, uma vez que ela é tão fácil para uma pessoa como para outra qualquer. Deus repartiu a cada um “a medida de fé”, a mesma medida para todos, já que a medida da graça é a medida da fé, “e a graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo”. (Efésios 4:7). Cristo entregou-Se sem reservas a todo homem (Hebreus 2:9). Por que foi dada a mesma medida de fé e de graça a todo homem, todos têm a mesma oportunidade de entrar na herança.
Jesus é a garantia: –A fé garante a promessa a toda a semente porque tem a Cristo como único centro, e Ele é a garantia das promessas de Deus (II Coríntios 1:20). Lemos ainda sobre o juramento feito por Deus através do qual Jesus foi constituído Sumo Sacerdote. “Por isso mesmo, Jesus Se tem tornado fiador de superior aliança”. (Hebreus 7:22). Jesus não Se deu somente a certa classe, mas a todos sem distinção. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o Seu Filho Unigênito, para que todo o que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. (João 3:16). Lemos em Hebreus 2:9 que Jesus, pela graça de Deus, experimentou a morte por todos. Nosso Senhor disse: “O que vem a Mim, de modo nenhum o lançarei fora”. (João 6:37) Cristo habita no coração pela fé (Efésios 3:17). Já que Cristo é o fiador da promessa, ela é garantida a todo aquele que crê.

O juramento de Deus: –Talvez lhe possa parecer algo atrevido dizer que o juramente pelo qual Jesus foi constituído Sumo Sacerdote seja a garantia da promessa feita a Abraão. Porém, um pouco de reflexão irá convencê-lo de que não pode ser de outra maneira. No sexto capítulo de Hebreus, versos 17 a 20, lemos: “Por isso, Deus, quando quis mostrar mais firmemente aos herdeiros da promessa a imutabilidade do seu propósito, se interpôs com juramento, para que, mediante duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, forte alento tenhamos nós que já corremos para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta; a qual temos por âncora da alma, segura e firme e que penetra além do véu, onde Jesus, como precursor, entrou por nós, tendo-se tornado sumo sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque”.
Tudo foi feito por nós – Por que Deus confirmou a promessa a Abraão mediante juramento? Para que tenhamos grande animação e coragem. Não foi por causa de Abraão, visto que ele creu plenamente sem necessidade de juramente. Sua fé mostrou-se perfeita antes que se fizesse o juramento. Foi por nós.
Quando esse juramento nos transmite “forte alento”? Quando corremos e nos refugiamos em Cristo como sacerdote no Lugar Santíssimo. Ministro como Sumo Sacerdote além do véu, e é o juramento de Deus que nos anima a crer que Seu sacerdócio nos salvará. De forma que nosso consolo vem do sacerdócio de Cristo e, portanto, do juramento que O constituiu sacerdote.
O juramento de Deus a Abraão foi idêntico àquele que constituiu Cristo como Sumo Sacerdote. Isso mostra plenamente que a promessa de Deus a Abraão é tão abarcante quanto o evangelho de Cristo. E é assim que nosso texto diz com referência à justiça que foi imputada a Abraão: “E não somente por causa dele está escrito que lhe foi levado em conta, mas também por nossa causa, posto que a nós igualmente nos será imputado, a saber, a nós que cremos naquele que ressuscitou dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor...”

O poder da Palavra de Deus: –Deus “chama as coisas que não são como se fossem”. Algumas vezes o homem faz isso mesmo, e então perdemos rapidamente a confiança nele. Quando o homem chama as coisas que não são como se fossem, há uma só palavra para definir o que faz – mentira. Porém Deus chama as coisas que não são como se fosse, e isso é verdade. Onde está a diferença? Simplesmente nisto: a palavra do homem não tem o poder de trazer à existência algo que não havia antes. Pode o homem insistir que seja assim, mas isso não converte o irreal em real. Porém, quando Deus nomeia algo, isso está na própria palavra pronunciada. Ele fala e o fato ocorre. Por esse poder divino Abraão foi feito o pai de muitas nações; nosso pai, se crermos que Jesus morreu e ressuscitou.

Dando vida aos mortos: –É graças ao poder da palavra de Deus, que chama as coisas que não são como se fossem, trazendo-as à existência, que os mortos são ressuscitados. Sua palavra os faz viver. Foi a fé de Abraão na ressurreição dos mortos que o fez pai de muitas nações. O juramento de Deus a Abraão teve lugar por ocasião do oferecimento de Isaque (Gênesis 22:15-18). “Pela fé, Abraão, quando posto à prova, ofereceu Isaque; estava mesmo para sacrificar o seu unigênito aquele que acolheu alegremente as promessas, a quem se tinha dito: Em Isaque será chamada a tua descendência; porque considerou que Deus era poderoso até para ressuscitá-lo dentre os mortos, de onde também, figuradamente, o recobrou”. (Hebreus 11:17-19).

A justiça e a ressurreição de Jesus: –A justiça imputada a Abraão também será concedida a nós outros, se crermos n’Aquele que ressuscitou nosso Senhor dentre os mortos. Disso se deduz que essa justiça foi imputada a Abraão em razão de sua fé na ressurreição dos mortos, que vem somente por meio de Cristo (Atos 4:2). Essa foi a pregação dos apóstolos: as promessas feitas aos pais. O poder pelo qual o homem se torna justo é o da ressurreição (Ver Filipenses 3:9-11). Esse poder da ressurreição, que opera justiça no homem é a segurança da ressurreição final para a imortalidade, no dia final, no momento em que ele entra em sua herança.

Sua fé não fraquejou: –“E, sem enfraquecer na fé, embora levasse em conta o seu próprio corpo amortecido, sendo já de cem anos, e a idade avançada de Sara”. Vale dizer que, depois que Deus lhe fizera a promessa, a plena consciência de sua debilidade e de todas as dificuldades e impossibilidades aparentes não conseguiram debilitar sua fé. Para Deus não há nada impossível; nada é difícil para Ele. Se alguma vez você se sentiu inclinado a duvidar da possibilidade de sua própria salvação, pare e considere que Deus fez o mundo através de Sua palavra e que Ele ressuscita os mortos, e tudo isso pelo mesmo poder que salvará você, se assim o desejar. Duvidar do poder de Deus para livrar-nos de toda maldade é descrer que Ele criou todas as coisas por Sua palavra, e que é capaz de ressuscitar os mortos.