CARTA AOS ROMANOS
Por Ellet J. Waggoner
Um dos dois mensageiros
de 1888
Tradução e Edição
César L. Pagani
Capítulo 9
Quem São os Verdadeiros
Israelitas?
O amor de Paulo por seus
irmãos – Romanos 9:1-18.
1 Digo a verdade em
Cristo, não minto, testemunhando comigo, no Espírito Santo, a minha própria
consciência:
2 tenho grande tristeza
e incessante dor no coração;
3 porque eu mesmo
desejaria ser anátema, separado de Cristo, por amor de meus irmãos, meus
compatriotas, segundo a carne.
4 São israelitas. Pertence-lhes
a adoção e também a glória, as alianças, a legislação, o culto e as promessas;
5 deles são os
patriarcas, e também deles descende o Cristo, segundo a carne, o qual é sobre
todos, Deus bendito para todo o sempre. Amém!
6 E não pensemos que a
palavra de Deus haja falhado, porque nem todos os de Israel são, de fato,
israelitas;
7 nem por serem
descendentes de Abraão são todos seus filhos; mas: Em Isaque será chamada a tua
descendência.
8 Isto é, estes filhos
de Deus não são propriamente os da carne, mas devem ser considerados como
descendência os filhos da promessa.
9 Porque a palavra da
promessa é esta: Por esse tempo, virei, e Sara terá um filho.
10 E não ela somente,
mas também Rebeca, ao conceber de um só, Isaque, nosso pai.
11 E ainda não eram os
gêmeos nascidos, nem tinham praticado o bem ou o mal (para que o propósito de
Deus, quanto à eleição, prevalecesse, não por obras, mas por Aquele que chama),
12 já fora dito a ela: O
mais velho será servo do mais moço.
13 Como está escrito:
Amei Jacó, porém me aborreci de Esaú.
14 Que diremos, pois? Há
injustiça da parte de Deus? De modo nenhum!
15 Pois ele diz a
Moisés: Terei misericórdia de quem Me aprouver ter misericórdia e
compadecer-Me-ei de quem Me aprouver ter compaixão.
16 Assim, pois, não
depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a Sua misericórdia.
17 Porque a Escritura
diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para mostrar em ti o Meu poder e para
que o Meu nome seja anunciado por toda a terra.
18 Logo, tem Ele
misericórdia de quem quer e também endurece a quem lhe apraz.
Esse é um trecho extenso das Escrituras, porém, se o abordarmos com
diligência a fim de compreendermos o que ele tem exatamente a dizer, não será
tão difícil interpretá-lo como se poderia supor.
Judeus e gentios: –Mesmo
Paulo, que era “o apóstolo dos gentios”, não se esquecia de seus “parentes
segundo a carne”. Aonde ia, pregava primeiramente aos judeus. Ele disse aos
anciões de Éfeso: “Jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de
vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa, testificando tanto a
judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus
Cristo”. (Atos 20:20) A solicitude de Paulo por todas as classes sociais,
inclusive aquelas que estavam distantes, mostra mais do que qualquer outra
coisa, sua semelhança com Jesus Cristo.
A vantagem de Israel: –“Qual é, pois, a
vantagem do judeu?... Muita, sob todos os aspectos”. (Romanos 3:1 e 2) Lemos no
texto um magnífico rol de bênçãos pertencentes a Israel: a adoção, a glória, os
concertos, a entrega da lei e o serviço de Deus, bem como as promessas. Ser
tido como infiel em meio a tais privilégios deve ser algo realmente
terrível.
“A salvação vem dos judeus”. – Jesus proferiu essas palavras à
samaritana, junto ao poço de Jacó (João 4:22). “Também deles descende o Cristo,
segundo a carne”. A Bíblia foi escrita por judeus e uma jovem judia foi a mãe
de nosso Senhor. Cristo era judeu, da tribo de Judá. Quando lemos que somos
“salvos por Sua vida” entendemos que é por Sua vida como judeu. Não há nenhum
dom nem bênção divina que não fossem “primeiramente ao judeu”, por cujo
conhecimento não podemos ficar em dívida com os hebreus.
Nada dos gentios: –Disse
o apóstolo Paulo acerca “dos gentios na carne”, que estavam “separados da
comunidade de Israel e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e
sem Deus no mundo”. (Efésios 2:11 e 12). Os pactos, as promessas, até o próprio
Cristo, pertencem aos judeus e não aos gentios. Portanto, todo aquele que se
salva deve sê-lo como judeu. “Deus, primeiramente, visitou os gentios, a fim de
constituir dentre eles um povo para o Seu nome”. (Atos 15:14).
Excluídos de Cristo – “Separados”, “estranhos”, “sem Cristo”
(Efésios 2:12). Trata-se da mais deplorável condição que possamos imaginar.
Estar sem Cristo é estar sem esperança e sem Deus no mundo.
Sendo certo que todas as promessas de Deus são feitas em Cristo (II
Coríntios 1:20), os que d’Ele estão separados não têm parte nelas. Podemos
garantir que o Israel segundo a carne, como nação terrena, não tem nem teve
jamais qualquer prerrogativa perante Deus, que o situasse acima de outras
nações. Deus não fez jamais nenhuma promessa especial a Israel segundo a carne,
que não estendera a qualquer outro povo.
No desejo expresso por Paulo, podemos ver quão completamente
entregue estava ele ao Senhor, e até que ponto partilhava de Seu Espírito.
Cristo entregou-Se pelo homem, consentindo mesmo em separar-Se de Deus, a fim
de poder alcançar e salvar os perdidos. Não há outro nome debaixo do céu, dado
aos homens, pelo qual podemos ser salvos. Por isso mesmo, tudo aquilo que Paulo
sofrera não poderia salvar seus irmãos, como ele mesmo bem o sabia.
Isso mostra claramente quão desesperador era o caso dos judeus, e
quão grande a solicitude de Paulo por eles. Embora nenhum sacrifício humano
tenha qualquer valor, é-nos concedido o privilégio de partilhar os sofrimentos
de Cristo por outros. Falando de si mesmo, Paulo disse: “Agora, me regozijo nos
meus sofrimentos por vós; e preencho o que resta das aflições de Cristo, na
minha carne, a favor do seu corpo, que é a igreja”. (Colossenses 1:24)
Circuncisão tornada em
incircuncisão: –Já vimos que “se és, porém, transgressor da lei, a tua
circuncisão já se tornou incircuncisão”. (Romanos 2:25). Paulo disse isso em
referência aos judeus, a quem acusou de transgredir a lei (Romanos 2:17-24). No
verso 31 do capítulo nono, lemos que Israel não atingiu a lei de justiça. A
razão é que não aceitou a Cristo, o único mediante quem é possível obter a justiça
da lei.
Vemos assim, uma vez mais, que os “parentes [israelitas] [de Paulo]
segundo a carne” não eram israelitas em realidade, mas gentios, sem Cristo,
“sem esperança e sem Deus no mundo”.
Nenhuma falha na promessa: –Aquela
era uma situação muito triste. Todas as promessas pertencem a Israel e não há
nada da parte de Deus para alguma outra nação; mas o povo conhecido como Israel
está separado de Cristo. Porém, a palavra de Deus não falhou, “porque nem todos
os que são de Israel são israelitas”. A incredulidade de alguns não pode anular
a fidelidade de Deus (Romanos 3:3). Mesmo que se perdessem todos os
descendentes literais de Jacó, isso não anularia as promessas de Deus a Israel,
porque os verdadeiros israelitas são unicamente os que crêem nas promessas.
A semente de Abraão: –“Em
Isaque será chamada a tua descendência”. Isaque era o filho da promessa; por
isso mesmo, todos os que crêem nas promessas de Deus são a semente de Abraão.
João Batista disse aos judeus que se sentiam seguros em razão de sua
ascendência: “Não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão;
porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão”.
(Mateus 3:9) Isso Deus pode fazer com a mesma facilidade com que, no princípio,
criou o homem a partir do pó da terra.
A carne e a promessa –“Isto é, estes filhos de Deus não são
propriamente os da carne, mas devem ser considerados como descendência os
filhos da promessa”. Só esse texto deveria bastar para silenciar as
especulações referentes a um suposto retorno dos judeus a Jerusalém, a fim de
possibilitar o cumprimento das promessas de Deus. Com maior razão ainda
deveriam pôr fim às suposições de que nações como a Inglaterra ou os Estados
Unidos constituam o verdadeiro Israel e sejam herdeiras das promessas de Deus.
Deus conhece o futuro – Antes que nascessem Jacó e Esaú, e antes
que houvessem podido fazer o bem ou o mal, foi dito a seu respeito: “O maior
servirá ao menor”. Deus conhece o fim desde o princípio e pode antecipar o que
fará cada um. A eleição foi segundo Aquele “que nos salvou e nos chamou com
santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a Sua própria
determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes
dos tempos eternos”. (II Timóteo 1:9).
“Amei a Jacó e aborreci a Esaú”. – Esse texto foi escrito muito
tempo após a morte de Jacó e de Esaú. “Não foi Esaú irmão de Jacó? —disse o
Senhor; todavia, amei a Jacó, porém aborreci a Esaú; e fiz dos seus montes uma
assolação e dei a sua herança aos chacais do deserto”. (Malaquias 1:2 e 3) De
acordo com o verso 4, seriam os edomitas chamados de povo contra quem o Senhor
está irado para sempre. Por quê?
“Assim diz o Senhor: Por
três transgressões de Edom e por quatro, não sustarei o castigo, porque
perseguiu o seu irmão à espada e baniu toda a misericórdia; e a sua ira não
cessou de despedaçar, e reteve a sua indignação para sempre”. (Amós 1:11) Jacó, ao contrário, embora não fosse menor
que Esaú por natureza, creu nas promessas de Deus e mediante elas tornou-se
participante da natureza divina e, desse modo, herdeiro de Deus e co-herdeiro
de Jesus Cristo.
Deus não faz injustiça: –Observe com atenção os versículos 14 a 17 e veja a evidência de
que não há arbitrariedade na eleição divina. Tudo é misericórdia. “Pois Ele diz
a Moisés: Terei misericórdia de quem Me aprouver ter misericórdia e
compadecer-Me-ei de quem Me aprouver ter compaixão”. “Porque a Escritura diz a
Faraó: Para isto mesmo te levantei, para mostrar em ti o Meu poder e para que o
Meu nome seja anunciado por toda a terra”.
Pouco importa que isso
se refira ao fato de Faraó haver sido levado ao trono, ou de ter sido ele
preservado para essa ocasião. Uma coisa é certa: isso não nos ensina, como se
costuma supor, que Deus guindou Faraó ao trono com o propósito de descarregar
Sua vingança nele. É incrível que professos cristãos tenham desonrado a Deus
com uma acusação como essa.
O propósito de Deus ao
suscitar Faraó ou mantê-lo no trono era demonstrar Seu poder a ele e nele, e
que o nome do Senhor fosse manifesto em toda a terra. Esse desígnio cumpriu-se
na destruição de Faraó devido à sua obstinada resistência. Porém se cumpriria
igualmente, e com melhor resultado para Faraó, se ele houvesse dado ouvidos à
palavra de Deus. O rei do Egito viu o poder de Deus, porém recusou-se a crer.
Se o fizesse teria sido salvo, porque o evangelho é o poder de Deus para a
salvação de todo aquele que crê.
Faraó tinha vontade
obstinada. Sua característica principal era a resolução de propósito, a
persistência, que se havia degenerado em obstinação. Porém,
quem pode imaginar o poder para o bem que Faraó poderia ter desenvolvido, se
houvesse se submetido de boa vontade ao Senhor? Isso teria sido um grande
sacrifício, segundo o conceito que o homem tem de sacrifício, porém, não maior
que o de Moisés. Esse recusou o trono egípcio e uniu sua sorte a do povo de
Deus.
Ao monarca foi oferecida
uma maravilhosa e honorável posição, contudo esse não reconheceu o dia de sua
visitação. Isso implicava em humilhação e ele se recusou. Em conseqüência,
perdeu tudo, enquanto Moisés, que escolheu antes ser afligido com o povo de
Deus e ter parte no vitupério de Cristo, tem um nome e um lugar que durará por
toda a eternidade. As misericórdias de Deus, quando rejeitadas, convertem-se em
maldições. “Os caminhos do Senhor são retos, e os justos andarão neles, mas os
transgressores neles cairão”. (Oséias 14:9).
Vimos que embora Deus
tenha escolhido pessoas especialmente chamadas, as quais posteriormente vieram
a ter grande destaque aos olhos divinos, a escolha não foi discricionária. Jacó
foi escolhido antes de nascer, porém, não mais do que os outros. Deus nos
abençoou com as bênçãos espirituais em Cristo, “assim como nos escolheu n’Ele
antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante Ele; e
em amor nos predestinou para Ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus
Cristo, segundo o beneplácito de Sua vontade, para louvor da glória de Sua
graça, que Ele nos concedeu gratuitamente no Amado”. (Efésios 1:4-6).
“Assim, pois, não
depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a Sua misericórdia.”
Como prova disso, o apóstolo mencionou Faraó, que foi escolhido em Cristo tanto
quanto Jacó e nós mesmos. Foi eleito para louvor da glória da graça de Deus, a
fim de revelar as excelências do Senhor, porém, resistiu-Lhe de forma contumaz.
Deus será louvado até mesmo pela ira do homem, quando esse se nega a louvá-Lo
espontaneamente. Foi assim que o nome e o poder de Deus se fizeram conhecidos
mediante a contumácia de Faraó.
Quão melhor teria sido se o orgulhoso rei se submetesse ao
desígnio divino, em lugar de ver cumprido o propósito do Senhor de outra
maneira. Entretanto, a lição que temos de aprender é que todo homem, em toda
nação, foi eleito; e sua escolha consiste em ser adotado como filho. Nessa eleição,
os judeus não têm nenhuma vantagem sobre os demais, mas estão em igualdade como
bem demonstra o restante do capítulo.
“Aceitos no Amado”: – Romanos 9:19-33.
19 Tu, porém, me dirás:
De que se queixa ele ainda? Pois quem jamais resistiu à Sua vontade?
20 Quem és tu, ó homem,
para discutires com Deus? Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por
que me fizeste assim?
21 Ou não tem o oleiro
direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro,
para desonra?
22 Que diremos, pois, se
Deus, querendo mostrar a Sua ira e dar a conhecer o Seu poder, suportou com
muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição,
23 a fim de que também desse a conhecer as riquezas da Sua glória em
vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão,
24 os quais somos nós, a
quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios?
25 Assim como também diz
em Oséias: Chamarei povo Meu ao que não era Meu povo; e amada, à que não era
amada;
26 e no lugar em que se
lhes disse: Vós não sois Meu povo, ali mesmo serão chamados filhos do Deus
vivo.
27 Mas, relativamente a
Israel, dele clama Isaías: Ainda que o número dos filhos de Israel seja como a
areia do mar, o remanescente é que será salvo.
28 Porque o Senhor cumprirá
a Sua palavra sobre a terra, cabalmente e em breve;
29 como Isaías já disse:
Se o Senhor dos Exércitos não nos tivesse deixado descendência, ter-nos-íamos
tornado como Sodoma e semelhantes a Gomorra.
30 Que diremos, pois?
Que os gentios, que não buscavam a justificação, vieram a alcançá-la, todavia,
a que decorre da fé;
31 e Israel, que buscava
a lei de justiça, não chegou a atingir essa lei.
32 Por quê? Porque não
decorreu da fé, e sim como que das obras. Tropeçaram na pedra de tropeço,
33 como está escrito:
Eis que ponho em Sião uma pedra de tropeço e rocha de escândalo, e aquele que
nela crê não será confundido.
Retrucando a Deus: –Esse é um fato comum e por causa disso muitos perderam a noção
de sua própria maldade. Aquele que pergunta indignado: “Por que Deus faz isto
ou aquilo?”; o que diz “Não vejo justiça em parte alguma”, como se ele fosse
especial e pessoalmente agravado, faz com que seja impossível para si mesmo
sequer compreender o que Deus permitiu que o mortal entendesse. É absurdo e
maléfico culpar a Deus, porque nós não somos iguais a Ele em sabedoria. A única
forma pela qual podemos chegar a um mínimo conhecimento do Altíssimo, é aceitar
de uma vez por todas que Ele é justo e misericordioso, e que tudo quanto faz é
visando ao bem de Suas criaturas. A reverência, e não o questionamento infame,
tem valor diante de Deus. “Aquietai-vos e sabei que Eu Sou Deus; Sou exaltado
entre as nações, Sou exaltado na Terra”. (Sal. 46:10)
O oleiro e seus vasos –
Aquele que se julga competente para criticar a Deus, pensa encontrar nos versos
21 a 24
um motivo de acusação contra Ele. Diz ele: “Esse texto mostra que Deus deu vida
a alguns homens para serem salvos e a outros para serem destruídos”.
Mas não é nada disso! Há
uma imensa diferença entre o que diz realmente o texto e o que esse homem
imaginou. O oleiro tem poder sobre o barro, com mais razão o Criador sobre Suas
criaturas, segundo o direito natural e inquestionável. Considere este exemplo:
o oleiro tem domínio para fazer do barro um vaso para honra e outro para
desonra. Certo. Porém, quem conhece em todo o mundo um só oleiro que se dedique
a fazer vasos simplesmente para destruí-los? Ele produz vasos de diversos tipos
segundo o propósito para cada um deles, porém, sempre para um determinado uso e
não para a destruição. Assim, Deus jamais criou a quem quer que seja com o
objetivo de destruí-lo.
A paciência de Deus: –O fato de Deus não pretender a destruição de ninguém é
demonstrado em Sua luta para que ninguém sofra a destruição que suas próprias
obras más lhe trazem em
justiça. Ele “suportou com muita longanimidade os vasos de
ira, preparados para a perdição”. Esses se tornaram credores da destruição por
sua própria rebeldia e impenitência, entesourando para si mesmos ira para o dia
da vingança. (Romanos 2:5). Observe que
Deus suportou com muita misericórdia esses “vasos de ira”. “... E tende por
salvação a longanimidade de nosso Senhor...” (II Pedro 3:15) “Ele é longânimo
para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento”.
(verso 9). Por ter Deus suportado com grande paciência os vasos de ira, fica
demonstrado que, mesmo depois de terem esses tomado o curso que os leva à
destruição, Ele procurou salvá-los, concedendo-lhes todas as oportunidades para
isso.
“Os quais também chamou”: –A paciência de Deus tem ainda o propósito
em tornar conhecidas as riquezas de Sua glória nos “vasos de misericórdia que
Ele preparou para Sua glória”. Quem são esses vasos? Nós, a quem também chamou.
Quem são os que Ele chamou? Pessoas procedentes de alguma nação em especial?
“Não só dos judeus, mas também dos gentios”. Todo este capítulo é uma
vindicação da eleição do homem por parte de Deus, mesmo antes de seu
nascimento, tal como ilustra o caso de Jacó. É demonstrado que a eleição de
Jacó não significou que Deus tivesse reservado privilégios especiais para o
povo judeu, mas que Ele outorga Seus favores com imparcialidade, tanto a judeus
como a gentios, contanto que O aceitem.
Povo de Deus: –Volta-se a insistir nos versos 25 e 26: “Disse o Senhor a Oséias
[cap. 1:9 e 10]: Põe-lhe o nome de Não-Meu-Povo, porque vós não sois Meu povo,
nem Eu serei vosso Deus. Todavia, o número dos filhos de Israel será como a
areia do mar, que se não pode medir, nem contar; e acontecerá que, no lugar onde
se lhes dizia: Vós não sois Meu povo, se lhes dirá: Vós sois filhos do Deus
vivo”. Deus visitou os gentios para despertar dentre eles um povo para o Seu
nome. O apóstolo Paulo descreveu essa visita nestes termos: “Ora, Deus, que
conhece os corações, lhes deu testemunho, concedendo o Espírito Santo a eles,
como também a nós nos concedera. E não estabeleceu distinção alguma entre nós e
eles, purificando-lhes pela fé o coração... Mas cremos que fomos salvos pela
graça do Senhor Jesus, como também aqueles o foram”. (Atos 15:8-11) “Pois não
há distinção entre judeu e grego, uma vez que o mesmo é o Senhor de todos, rico
para com todos os que O invocam”. (Romanos 10:12).
O remanescente: –“Mas, relativamente a Israel, dele clama Isaías: Ainda que o
número dos filhos de Israel seja como a areia do mar, o remanescente é que será
salvo”. “Assim, pois, também agora, no tempo de hoje, sobrevive um remanescente
segundo a eleição da graça”. (Romanos 11:5) Pouco importa quantos há cuja
genealogia remonte até Jacó, segundo a carne, somente serão salvos os que se
entregam voluntariamente à graça de Deus. Certamente não há motivo para
gloriar-se, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo.
Os gentios, a cabeça: –Os judeus professavam guardar a lei, porém, a realidade era outra.
Os gentios não estavam familiarizados com a lei, contudo, cumpriam seus
reclamos. Se você agora rememorar Romanos 2:25 a 29, verá que a verdadeira
circuncisão consiste (e sempre foi
assim) em guardar a lei. Por isso, uma vez que os gentios guardaram a lei pela
fé, e os judeus, por sua falta de fé, deixaram de observá-la, conclui-se que
uns e outros inverteram suas respectivas posições. Os gentios se tornaram
“verdadeiros judeus” e os judeus por natureza, transformaram-se em pagãos.
Não atingir o alvo: –Os judeus se esforçaram por observar a lei da justiça, porém não
da maneira certa. “Por quê? Porque não decorreu da fé, e sim como que das
obras”. Com poder essas palavras estabelecem aquela que é a idéia principal em
toda a epístola, isto é, que a fé não exime a ninguém da transgressão, e que
somente por ela é possível obedecer à lei.
Os judeus não são
culpados por desejarem atender à lei da justiça, mas por não quererem
obedecê-la da forma devida. Não é pelas obras, mas pela fé, que é possível
praticar o quanto a lei exige. Isso equivale a dizer que não é possível fazer
boas obras a partir das más obras. O bem não pode originar-se do mal. Tampouco
existe qualquer redução no que respeita às boas obras. Elas são aquilo que o
mundo necessita, acima de tudo. São o resultado da observância da lei pela fé.
Porém, é totalmente impossível que as boas obras surjam sem fé, já que “tudo o
que não provém de fé é pecado”. (Romanos 14:23).
A pedra de tropeço: –Nunca deixe de relacionar a última parte deste
capítulo com a primeira. Lembre-se de que, no princípio, é apresentado o Israel segundo a carne, como
separado de Cristo. A eles pertencia,
entre outras coisas, a entrega da lei, no entanto, fracassaram
miseravelmente em relação a ela. Por quê?
Porque “tropeçaram na pedra de tropeço”. Que pedra é essa? Cristo.
Estavam na mesma condição em que muitos se encontram hoje. Negavam-se a crer
que as promessas de Deus a Israel eram total e unicamente em Cristo. Pensavam
o mesmo que muitos professos cristãos modernos, isto é, que Deus os honrava por
causa deles mesmos, à parte de Cristo. Cristo é a pedra de tropeço ou escândalo
na qual tropeçam todos os que entendem as promessas feitas a Israel como
ligadas exclusivamente a certa nação, com exclusão das demais.
Um fundamento estável: –Paradoxal, porém correto, é que essa mesma
pedra de tropeço é a pedra angular e o sólido fundamento. Aquilo que faz cair a
uns é o que eleva e edifica a outros. “Os caminhos do Senhor são retos, e os
justos andarão neles, mas os transgressores neles cairão”. (Oséias 14:9) Cristo
é uma rocha de escândalo para os que não crêem, contudo, um alicerce seguro
para os que têm fé. Ele é o “Santo de Israel”, o “Deus de Israel”, “Pastor de
Israel”, redil e porta, tudo ao mesmo
tempo. Sem Ele a nação de Israel não poderia existir.
Os que pretendem
reclamar uma herança em Israel por causa do seu nascimento, e não por causa de
Cristo, serão finalmente decepcionados, porquanto todo aquele que não entra
pela porta será desmascarado como “ladrão e salteador”. No entanto, quem n’Ele
crer nunca será envergonhado (I Pedro 2:6), porque sua fé demonstrará que ele é
semente de Abraão e herdeiro conforme a promessa.