domingo, 1 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 10.

O Concerto Eterno, capítulo 10.

O Chamado de Abraão

A Promessa e o Juramento

O sacrifício tinha sido feito; a fé de Abraão havia sido testada e achada perfeita. “Então o Anjo do Senhor bradou a Abraão pela segunda vez desde o céu, e disse: Por Mim mesmo jurei, diz o Senhor, porquanto fizeste isto, e não Me negaste teu filho, o teu único filho, que deveras te abençoarei, e grandemente multiplicarei1 a tua descendência, como as estrelas do céu e como a areia que está na praia do mar; e a tua descendência possuirá a porta dos seus inimigos; e em tua descendência serão benditas todas as nações da terra; porquanto obedeceste à Minha voz”. Gên. 22:15-18.

Na epístola aos Hebreus aprendemos o significado do fato de que Deus jurou por Si mesmo. O leitor imediatamente verá que a passagem seguinte tem referência direta a que acabamos de citar: —

“Porque, quando Deus fez a promessa a Abraão, como não tinha outro maior por quem jurasse, jurou por Si mesmo, dizendo: Certamente abençoando te abençoarei, (85) e multiplicando te multiplicarei. E assim, esperado com paciência, ele alcançou a promessa. Porque os homens certamente juram por alguém superior a eles, e o juramento para confirmação é, para eles, o fim de toda contenda. Por isso, querendo Deus mostrar mais abundantemente aos herdeiros da promessa a imutabilidade do Seu conselho, Se interpôs com juramento; para que por duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, tenhamos firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a esperança proposta; a qual temos como âncora da alma, segura e firme, e que penetra até o interior do véu; aonde Jesus, nosso precursor, entrou por nós, feito Sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque”. Heb. 6:13-20.

O juramento não foi por causa de Abraão. Sua crença em Deus foi completa sem o juramento para respaldar a promessa. Sua fé havia sido revelada perfeita, antes que o juramento fosse feito. Ademais, se tivesse sido por sua causa, não teria havido necessidade de registrá-la, uma vez que ele morreu muito antes que o registro fosse escrito. Mas Deus estava mais abundantemente disposto a mostrar aos herdeiros da promessa a imutabilidade de Seu conselho, e assim Ele confirmou a promessa por um juramento.

Em Cristo Somente

E quem são os herdeiros da promessa?—A cláusula seguinte nos diz. O juramento foi a fim de que “tenhamos firme consolação”. O juramento foi feito por nossa causa. Isso mostra que o concerto com Abraão nos diz respeito. Aqueles que são de Cristo são semente de Abraão, e herdeiros conforme a promessa; e esse juramento foi dado para servir-nos de incentivo, quando buscamos refugiar-nos em Cristo.

Quão plenamente esta última referência nos mostra que o teor integral do concerto com Abraão, com todas as suas promessas incluídas, é puramente o Evangelho. O juramento respalda a promessa; mas o juramento concede-nos consolação quando buscamos nos refugiar em Cristo; portanto, a promessa refere-se àquilo que é para ser conquistado em Cristo. Isso é também mostrado no (86) texto que tem sido tantas vezes repetido, “E, se sois de Cristo, então sois descendência de Abraão, e herdeiros conforme a promessa2. A promessa nada tinha mais em vista a não ser Cristo e as bênçãos que são concedidas através da Sua cruz. Assim é que o apóstolo Paulo, cuja determinação era nada mais saber a não ser “Jesus Cristo, e Este crucificado”3 poderia também dizer que Ele permaneceu e foi julgado “por causa da esperança da promessa que por Deus foi feita a nossos pais”. Atos 26:6. A “esperança da promessa que por Deus feita a nossos pais” é “a esperança proposta”4 em Cristo e que é tornada “mais abundantemente”5 segura pelo juramento de Deus a Abraão.

O juramento de Deus confirmou o concerto. O juramento pelo qual a promessa foi confirmada nos concede forte consolação quando buscamos refúgio no santuário, onde Cristo é sacerdote em nosso favor, segundo a ordem de Melquisedeque. Portanto, esse juramento foi o mesmo que tornou Cristo sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedeque. Portanto este juramento era o mesmo juramento que fez Cristo sacerdote segundo a ordem de Melquizedeque. Isso é claramente estabelecido na declaração de que Cristo foi tornado sacerdote “com juramento por Aquele que Lhe disse: Jurou o Senhor, e não Se arrependerá: Tu és Sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque” (Heb. 7:21), e que Ele é capaz, conseqüentemente, de salvar perfeitamente todos quantos vão a Deus mediante Ele (vs. 25).

Ainda mais, o juramento pelo qual Cristo foi tornado sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque foi o juramento com que Ele é feito fiador de uma “melhor aliança” (verso 22), isto é, o novo concerto. Mas o juramento pelo qual Jesus foi tornado sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque, foi o mesmo juramento pela qual o concerto com Abraão foi confirmado. Portanto, o concerto com Abraão é idêntico, em seu escopo, com o novo concerto. Nada há no novo concerto que não conste do concerto com Abraão; e ninguém jamais será incluído no novo concerto que não seja filho de Abraão mediante o concerto feito com ele.

Que maravilhosa consolação é perdida por aqueles que deixam de ver o Evangelho e o Evangelho somente na promessa de Deus a Abraão. A “firme consolação”6 que o juramento de Deus nos concede, está na obra de Cristo como “um Sumo Sacerdote misericordioso e fiel nas coisas concernentes a Deus, a fim de fazer reconciliação pelos pecados do povo”. Como Sacerdote Ele (87) apresenta o Seu sangue, mediante o qual temos redenção, de fato o perdão de pecados. Como Sacerdote Ele não só nos propicia misericórdia, mas “graça em tempo oportuno”. Isso nos é assegurado “sem acepção de pessoas”, pelo juramento de Deus.

“Forte Consolação”

Aqui jaz uma pobre, tímida e tremente alma, desprezada e desanimada por um senso de pecados cometidos, e de geral fraqueza e indignidade. Teme que Deus não a aceitará. Pensa que é por demais insignificante para que Deus a perceba, e que não faria diferença a ninguém, nem mesmo a Deus, caso viesse a perder-se. A alguém assim o Senhor declara: “Ouvi-me vós, os que seguis a justiça, os que buscais ao Senhor; olhai para a rocha donde fostes cortados, e para a caverna do poço donde fostes cavados. Olhai para Abraão, vosso pai, e para Sara, que vos deu à luz; porque ainda quando ele era um só, Eu o chamei, e o abençoei e o multipliquei. Porque o Senhor consolará a Sião; consolará a todos os seus lugares assolados, e fará o seu deserto como o Éden e a sua solidão como o jardim do Senhor; gozo e alegria se acharão nela, ações de graça, e som de cântico”. Isa. 51:1-3.

Olhe para Abraão, criado como um pagão, e veja o que Deus fez por ele, e o que Ele lhe prometeu, confirmando-o com um juramento de Si mesmo, por sua causa. Você pensa que não faria diferença ao Senhor se você viesse a se perder por ser tão obscuro e insignificante. Ora, a dignidade ou indignidade de cada um nada tem a ver com a questão. O Senhor declara: “Eu, Eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de Mim, e dos teus pecados não Me lembro”. Isa. 43:25. Por Sua própria causa? Sim, certamente; por causa de Seu grande amor com o qual nos amou, Ele Se colocou sob um sério compromisso de cumprir isso. Ele jurou por Si mesmo salvar todos quantos a Ele fossem mediante Jesus Cristo, e “Ele permanece fiel; porque Ele não pode negar-Se a Si mesmo”. 2 Tim. 2:13.

Pensem nisso; Deus jurou por Si mesmo! Isto é, Ele jurou a Si mesmo, e Sua própria existência, para nossa salvação em Jesus Cristo. Ele Se colocou (88) como fiador. A Sua vida pela nossa, caso nos perdermos enquanto nEle confiando. Sua honra está em jogo. Não se trata de uma questão de se somos ou não insignificantes e de pouco ou nenhum valor. Ele próprio declara que nós somos “menos do que nada”. Isa. 40:17. Ele declara que nós nos vendemos por nada (Isa. 52:3), o que mostra o nosso verdadeiro valor; mas devemos ser redimidos sem dinheiro, pelo precioso sangue de Cristo. O sangue de Cristo é a vida de Cristo; e a vida de Cristo a nós concedida torna-nos participantes de Seu valor. A única questão é—pode Deus vir a quebrar o, ou esquecer-se do Seu juramento? A resposta é que temos “duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta”6.

Pensem no que estaria envolvido na quebra dessa promessa e desse juramento. A palavra de Deus, que traz a promessa, é a palavra que criou os céus e a Terra, e que os sustenta. “Levantai ao alto os vossos olhos, e vede quem criou estas coisas. Foi Aquele que faz sair o exército delas segundo o Seu número; Ele as chama a todas pelos seus nomes; por causa da grandeza das Suas forças, e porquanto é forte em poder, nenhuma delas faltará. Por que dizes, ó Jacó, e falas, ó Israel: O meu caminho está escondido ao Senhor, e o meu juízo passa despercebido ao meu Deus?” Isa. 40:25-27. A parte precedente do mesmo capítulo fala da palavra de Deus que criou todas as coisas, e que permanecerá para sempre, e as palavras são citadas pelo apóstolo Pedro, com a declaração adicional, “mas a palavra do Senhor permanece para sempre. E esta é a palavra que vos foi evangelizada”. I Ped. 1:25.

É a palavra de Deus em Cristo que sustém o universo, e mantém as inumeráveis estrelas em seus lugares. “Todas as coisas subsistem por Ele”7. Se Ele viesse a falhar, o universo entraria em colapso. Mas Deus não é menos seguro do que a Sua palavra, pois a Sua palavra é respaldada por Seu juramento. Ele comprometeu a Sua própria existência para o cumprimento de Sua palavra8. Se a Sua palavra fosse quebrada quanto à mais humilde alma do mundo, Ele próprio cairia em descrédito, e seria desonrado e destronado. O universo entraria em caos e seria aniquilado.

Assim, o universo inteiro está empenhado em assegurar a salvação de toda alma que a busca em Cristo. O poder manifestado nela é o poder posto em penhor para assistir aos fracos. Na medida em que exista a matéria, a palavra de Deus permanecerá seguramente. “Para sempre, ó Senhor, a Tua palavra (89) permanece no céu.” Sal. 119:89. Seria um lamentável prejuízo para você vir a perder a salvação; mas seria um dano muito maior para o Senhor, se você chegasse a obtê-la por alguma falha da parte dEle. Então, que a alma, outrora duvidosa, cante:

“Seu juramento, Seu concerto, Seu sangue,

Me sustentam no dilúvio arrasador;

Quando tudo ao redor de minha alma falha,

Ele, então, é toda a minha esperança e firmeza”(9)

The Present Truth, 9 de julho de 1896.

Notas desta edição:

1) “Abençoando Eu abençoarei”, e “multiplicando Eu multiplicarei”, é a tradução literal de uma expressão hebraica muito comum. A ênfase em hebraico é caracterizada pela repetição. Em nosso idioma o texto reza, “Eu deveras te abençoarei e grandissimamente multiplicarei a tua semente.” Gên 22: 17. Exemplos semelhantes podem ser vistos na margem de Gên. 2:16, 17, da KJV, “comendo deves comer”, e “morrendo deves morrer”, pois “podeis livremente comer”, e, “certamente morrereis”. Em Êxo. 3:7, “Tenho visto atentamente a aflição do meu povo”, ocorre a mesma expressão idiomática. “Vendo, eu vi. . .” Em Atos 7:34 essa repetição enfática é preservada em “eu vi, eu vi a aflição de Meu povo”; na Almeida, “tenho visto atentamente”. Há uma impressionante profecia em Cantares 5:2, na Septuaginta, “batendo, batendo”, e o texto paralelo, no cumprimento desta profecia, Apoc. 3:20, no grego, “batendo, batendo”;

2) Gálatas 3:29;

3) I Coríntios 2:2;

4) Hebreus 6:18, ú. p.;

5) Veja João 10:10 e Tito 3:6;

6) Hebreus 6:18;

7) Colossenses 1:17, ú. p.;

8) Veja Hebreus 6:13;

9) Tentou-se arranjar uma rima em português para esta estrofe. Seria bom, pelo menos, arranjarmos um hino do nosso hinário, em volta das idéias deste soneto. Isto seria motivador para que se usasse este capítulo como um sermão. Aliás seria bom que cada capítulo deste livro fosse um sermão, com um hino aprópriado, inspirador, ao final.