domingo, 15 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 33

O Concerto Eterno, Capítulo 33

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As Promessas a Israel

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O Véu e a Sombra

“Mas, se ainda o nosso evangelho está encoberto, para os que se perdem que está encoberto, nos quais o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus” (2ª Cor. 4:3, 4).

“E aconteceu que, quando Moisés desceu do monte Sinai, trazendo nas mãos as duas tábuas do testemunho, sim, quando desceu do monte, Moisés não sabia que a pele do seu rosto resplandecia, por haver falado com Deus” (Êxo.34:29). Pelo fato de Moisés ter falado com Deus, sua face brilhava exatamente após ele ter saído da presença imediata de Deus. “Olhando, pois, Arão e todos os filhos de Israel para Moisés, eis que a pele do seu rosto resplandecia; por isso temeram chegar-se a ele. Então Moisés os chamou, e Arão e todos os príncipes da congregação tornaram-se a ele; e Moisés lhes falou. Depois chegaram também todos os filhos de Israel, e ele lhes ordenou tudo o que o Senhor falara com ele no monte Sinai. Assim que Moisés acabou de falar com eles, pôs um véu sobre o rosto. Mas, entrando Moisés perante o Senhor, para falar com Ele, tirava o véu até sair; e saindo, falava com os filhos de Israel o que lhe era ordenado. Assim, pois, viam os filhos de Israel o rosto de Moisés, e que resplandecia a pele do seu rosto; e tornava Moisés a pôr o véu sobre o seu rosto, até entrar para falar com Ele” (Versos 30-35).

[238] A descrença cega a mente. Age como um véu, encobrindo a luz. É somente pela fé que entendemos. Moisés tinha uma fé profunda e contínua; portanto, ele “ficou firme, como vendo Aquele que é invisível”[1]. Ele não precisava de véu sobre a face mesmo quando na presença imediata da glória de Deus. O véu que ele pôs sobre a face quando desceu para falar com os filhos de Israel era somente por causa deles, porque sua face brilhava tanto que eles não podiam encará-lo. Mas quando ele voltou para falar com Deus, removeu o véu.

O véu sobre a face de Moisés era uma concessão à fraqueza do povo. Se ele não o tivesse posto, então cada um teria sido obrigado a pôr um véu sobre a própria face a fim de aproximar-se para ouvir a Moisés. Eles não eram capazes, como Moisés, de contemplar a glória de Deus com rosto descoberto. Praticamente, portanto, cada um deles tinha um véu sobre a sua própria face. A face de Moisés estava desvendada.

Aquele véu sobre a face dos filhos de Israel representava a descrença que havia em seus corações. Assim, o véu estava na verdade sobre os seus corações. “Os seus sentidos foram endurecidos”; e “até hoje, quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles[2]. Isso é verdadeiro não só com respeito ao povo judeu, mas a respeito de todos que não vêem a Cristo inserido em todos os escritos de Moisés.

Um véu interposto entre o povo e a luz, os deixa em sombras. Assim, quando os filhos de Israel estenderam o véu da descrença entre eles e “a luz do evangelho da glória de Cristo”[3], eles naturalmente apenas tiveram a sombra dele. Receberam somente a sombra das boas coisas que lhes foram prometidas, em lugar da própria substância. Observemos algumas das sombras em comparação com as realidades.

Nos quais o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus

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Sombra e Substância

1. Deus havia dito, “se diligentemente ouvirdes a Minha voz e guardardes a Minha aliança, então . . . Me sereis um reino sacerdotal”[4]. Mas eles nunca se tornaram uma nação de sacerdotes. Somente uma tribo, a de Levi, podia ter qualquer ligação direta com o santuário, e daquela [239] tribo, somente uma família, a de Arão, podia atuar no sacerdócio. Significava morte certa se qualquer um que não fosse da família de Arão pretendesse servir como sacerdote em qualquer forma. Contudo, todos quantos são realmente filhos de Deus mediante fé em Cristo Jesus, são uma “nação de sacerdotes”, mesmo um “sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais, aceitáveis a Deus por Jesus Cristo” (1ª Pedro 2:5). Isso foi o que Deus prometeu à nação judaica, no Sinai; mas eles nunca o alcançaram porque não observaram o Seu concerto de fé, antes, confiaram em sua própria força.

2. Em vez de serem conduzidos ao santuário celestial que as mãos de Deus estabeleceram, e nele serem implantados, eles tinham um santuário feito pelo homem, e não tiveram permissão de adentrar até mesmo nesse.

3. O trono de Deus, no santuário acima, é um trono vivo, que se move por si mesmo, indo e vindo como um relâmpago, em imediata resposta ao pensamento do Espírito. Ezequiel 1. Pelo contrário, eles tinham no santuário terrestre apenas uma débil representação desse trono na forma de uma arca de madeira e ouro, que tinha que ser transportada sobre os ombros de homens.

4. A promessa no concerto com Abraão que o povo de Deus devia observar era de que a lei devia ser colocada no coração. Os filhos de Israel a obtiveram em tábuas de pedra. Em vez de pela fé receberem “a lei do espírito de vida em Cristo Jesus (Rom. 8:2), ou seja, sobre a “pedra viva” no meio do trono de Deus (ver 1ª Ped. 2:3; Apo. 5:6), que lhes comunicaria vida, tornado-os também pedras vivas, eles receberam a lei somente sobre tábuas de pedra frias e sem vida, que nada lhes podia conceder a não ser a morte.

5. Em suma, em vez do ministério da justiça de Deus em Cristo, eles somente obtiveram um ministério de morte; pois a própria coisa que é um sabor de vida para aqueles que crêem, é um sabor de morte para os que não creem.

Mas vejam a bondade e misericórdia de Deus até nisso. Ele lhes ofereceu o brilhante resplendor de Seu glorioso evangelho e eles interpuseram um véu de descrença, de modo que podiam receber somente a sombra. Contudo, essa mesma sombra era um lembrete constante da substância. Quando uma nuvem grossa e passageira lança uma sombra sobre a Terra, sabemos, se não formos muito obtusos para pensar, que ela não poderia lançar uma sombra se não fosse em [240] função do sol; assim, mesmo a nuvem proclama a presença do sol. Se, portanto, as pessoas hoje em dia, mesmo professando ser cristãs, não fossem tão cegas como os filhos de Israel sempre foram, estariam sempre se regozijando na luz do semblante de Deus, uma vez que mesmo uma nuvem sempre prova que a luz está presente, e a fé sempre faz com que a nuvem desapareça, ou, ao menos, veja nela o arco da promessa.

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Testemunho de Deus em Descrença

Era preferível aos judeus terem a lei, mesmo como uma testemunha contra eles, do que não tê-la de nenhum modo. Era-lhes uma grande vantagem de todas as formas ter-lhes sido confiados os oráculos de Deus. Rom. 3:2. É melhor ter a lei presente para nos repreender por nossos pecados e apontar-nos o caminho da justiça, do que sermos deixados inteiramente sem ela. Assim, os judeus, mesmo em sua descrença, tinham uma vantagem sobre os pagãos, porque os judeus tinham “a forma da ciência e da verdade na lei” (Rom. 2:20). Conquanto essa forma não os pudesse salvar, e somente tornava a sua condenação maior se rejeitassem a instrução destinada a lhes ser transmitida pela mesma, não obstante era uma vantagem que lhes servia como uma constante testemunha da parte de Deus. O Senhor não deixou os pagãos sem testemunho, pois Ele lhes falava a respeito de Si mesmo mediante as coisas que havia feito, pregando-lhes o evangelho na criação; mas o testemunho que Ele deu aos judeus, além de outros, era a própria imagem de Suas próprias realidades eternas.

E as próprias realidades eram para o Seu povo. Somente o véu da descrença sobre os seus corações os impedia de terem a substância da qual tinham a sombra; mas “em Cristo é ele abolido” (2ª Cor. 3:14), e Cristo estava até presente com eles. Quando quer que o coração se volte para o Senhor, o véu será removido. Mesmo o mais cego podia ver que o santuário do velho concerto, [5]

e as ordenanças do serviço divino que a ele se ligavam, não eram as realidades que Deus havia jurado a Abraão e a sua semente. Assim, eles todos poderiam imediatamente se ter volvido ao Senhor, tal como indivíduos fizeram ao longo de toda a história de Israel.

[241] Moisés falava com Deus com face descoberta. Quando o povo “pôs-se de longe”[6], Moisés chegava perto. É somente pelo sangue de Cristo que qualquer pessoa pode chegar perto. Pelo sangue de Jesus temos a ousadia de entrar até no santíssimo[7], no lugar secreto de Deus. O fato de que Moisés o fez mostra o seu conhecimento do poder do precioso sangue, e sua confiança nele. Mas o sangue, que foi capaz de conceder ousadia e acesso a Moisés, poderia ter cumprido o mesmo para todos os demais, se eles tivessem crido como ele creu.

Não se esqueçam que a presença de uma sombra prova o brilho presente do sol. Se a glória da justiça de Deus não estivesse presente em sua plenitude, o povo de Israel não poderia ter tido sequer a sombra. E uma vez que foi a descrença que provocou a sombra, a fé os teria trazido imediatamente à plena luz do sol, e eles poderiam ter sido “o louvor e glória da Sua graça”[8].

Moisés viu a glória com face desvelada, e foi transformado por ela. Assim, se cremos, “todos nós, com rosto descoberto, refletindo como um espelho a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor” (2ª Cor. 3:18). O mesmo poderia dar-se com os filhos de Israel, se tivessem crido, pois o Senhor nunca foi parcial. Aquilo que Moisés compartilhava, todos poderiam ter compartilhado.

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O Que Foi Abolido

“Porque o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê” (Rom. 10:4). Ele “destruiu a morte, e trouxe à luz a vida e a imortalidade pelo evangelho” (2 Tim. 1:10); e esse evangelho foi pregado a Abraão e a Israel no Egito, e no deserto. Mas por causa da descrença do povo, “eles não puderam olhar o fim daquilo que fora abolido” (2ª Cor. 3:13, KJV). Porque a fé deles não se firmava em Cristo, obtiveram a lei somente como um “ministério de morte” (vs. 7), em vez da “lei do espírito de vida, em Cristo Jesus”[9].

As pessoas falam sobre a “era do Evangelho” e a “dispensação do evangelho” como se o evangelho fosse uma idéia posterior da parte [242] de Deus, ou, no máximo algo que Deus demorou muito para conceder à humanidade. Mas as Escrituras nos ensinam que “a dispensação do evangelho” ou a “era do evangelho” vai do Éden perdido ao Éden restaurado. Sabemos que “este evangelho do reino será pregado em todo o mundo, em testemunho a todas as nações, então virá o fim” (Mat. 24:14). Esse é o fim de tudo, mas o início foi na queda do homem. O apóstolo Paulo dirige nossa atenção ao homem no começo, coroado de glória e honra, e estabelecido sobre as obras das mãos de Deus. Dirigindo-nos para fixarmos os olhos sobre o homem no Éden, senhor de tudo quanto via, o Apóstolo prossegue: “Mas agora ainda não vemos que todas as coisas lhe estejam sujeitas” (Heb. 2:8, ARC). Por que não?—Porque ele caiu, e perdeu o reino e a glória. Mas ainda olhamos para o lugar onde primeiro vimos o homem na glória e poder da inocência, e onde o vimos pecar e perder a glória de Deus, e “vimos a Jesus”. Cristo veio para buscar e salvar o que se havia perdido; e onde Ele iria buscar a não ser onde foi perdido? Ele veio para salvar o homem da queda, e assim necessariamente foi para onde o homem caiu. Onde o pecado abunda, a graça é mais abundante. Destarte, a “dispensação do evangelho” com a cruz de Cristo derramando a luz da glória de Deus sobre a escuridão do pecado, remonta à queda de Adão. Onde o primeiro Adão caiu, ali o segundo Adão Se ergue, pois ali a cruz é erigida.

Porque assim como a morte veio por um homem, também a ressurreição dos mortos veio por um homem.”, porque o segundo Adão é um “Espírito vivificante” (1ª Cor. 15:21, 45), sendo “a ressurreição e a vida”[10]. Portanto, em Cristo a morte foi abolida, e a vida e imortalidade foram trazidas à luz pelo evangelho no mesmo dia em que Adão pecou. Se não tivesse sido assim, Adão teria morrido naquele mesmo dia. Abraão e Sara provaram em seus próprios corpos que Cristo havia abolido a morte, pois ambos experimentaram o poder da ressurreição, regozijando-se em ver o dia de Cristo. Muito mais, então, foi a “dispensação do evangelho” em plena glória, tão remotamente na história do mundo quanto o Sinai. Seja que outra dispensação além da dispensação do evangelho qualquer pessoa haja compartilhado, isso tem sido unicamente por causa de seus corações duros e impenitentes, que despreza as riquezas da bondade e longanimidade de Deus, entesourando para si próprios ira para o dia da ira.

[243] Logo, bem ali no Sinai o ministério da morte foi removido em Cristo. A lei estava “nas mãos de um Mediador” (Gál. 3:19, KJV), de modo que constituía vida para todos que a recebiam nEle. A morte, que procede do pecado, e a força do que é a lei, foi abolida, e a vida colocada em seu lugar para todo o que crê, não importa quantos ou quão poucos fossem.

Que ninguém, porém, se esqueça que tal como o evangelho estava em plena glória no Sinai, assim também se dava com a lei, tal como dada no Sinai, está sempre presente no evangelho. Se a lei nas tábuas de pedra, destituídas de vida, era somente uma sombra, não obstante uma sombra exata, da lei viva sobre a Pedra viva, Cristo Jesus. Deus desejava que todos os homens soubessem, onde quer que Sua voz seja ouvida, que a justiça, que a obediência de Cristo comunica ao crente, é a justiça descrita na lei pronunciada no Sinai. Nenhuma letra pode ser alterada. É uma exata fotografia do caráter de Deus em Cristo. Uma fotografia não é mais do que uma sombra, é certo; mas, se a luz estiver clara, é uma exata representação de alguma substância. Neste caso a luz era “a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus” (2ª Cor. 4:4), de modo que possamos saber que os dez mandamentos são a forma exata e literal da justiça de Deus. Eles nos descrevem exatamente o que o Espírito Santo imprimirá em letras vivas de luz sobre as tábuas de carne de nossos corações, se forem somente sensibilizados pela simples fé.

n The Present Truth, 17 de dezembro de 1896



[1] Hebreus 11:27, KJV;

[2] 2ª Cor. 3: 14 e 15;

[3] 2ª Cor. 4.4;

[4] Êxodo 19: 5 e 6;

[5] Paulo, em Hebreus, chama a fase anterior à cruz do Novo Concerto de “Velho Concerto,” no que é seguido por Waggoner aqui. Entretanto, a rigor, de acordo com a exposição de Patriarcas e Profetas (ver arquivo postado antes deste, Adendo ao Capítulo 32), o Velho Concerto (que “gera filhos para a escravidão,” Gal 4:24), registrado em Êxodo capítulos 19 e 24, nunca teve santuário. O Santuário terrestre, bem como o serviço nele, mediante os sacerdotes, era uma figura do verdadeiro Santuário, no Céu, no qual Cristo ministra hoje como nosso Sumo Sacerdote. O Santuário terrestre foi uma grande “PARÁBOLA” do plano da salvação, e, como tal fazia parte integrante da primeira fase (anterior à cruz) do Novo Concerto.

[6] Êxodo 20:18;

[7] Hebreus 10:19;

[8] Efésios 1:6;

[9] Romanos 8:2;

[10] João 11: 25;