domingo, 1 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 7.

O Concerto Eterno, capítulo 7.

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O Chamado de Abraão

O Concerto Selado (Parte 1)

Agora chegamos a um registro que apresenta a promessa na forma mais maravilhosa. Mais de vinte e cinco anos se passaram desde que Deus primeiro fez a promessa a Abraão.1 Sem dúvida o tempo havia sido prolongado devido ao passo errado que Abraão dera, ao dar ouvidos à sugestão da esposa. Mais de treze anos decorrera desde aquele tempo. Abraão, porém, havia aprendido a lição, e agora Deus lhe apareceu novamente.

“Quando Abrão tinha noventa e nove anos, apareceu-lhe o Senhor e lhe disse: Eu sou o Deus Todo-Poderoso; anda em minha presença, e sê perfeito.” Gên. 17:1. Na margem2 consta, “justo, ou sincero”. Como em I Crô. 12:33, 38, o sentido é—de um só coração.3 Deus disse a Abraão para ser sincero perante Ele, e não de coração volúvel. Quando nos recordamos da história, registrada no capítulo precedente, vemos a força dessa recomendação. Vemos também a força da declaração: “Eu sou o Deus Todo-Poderoso”. Deus permitiria que ele soubesse que Ele era plenamente capaz de levar a efeito a Sua promessa, e que, portanto, ele deveria confiar nEle com um coração perfeito ou integral. (64)

Um Novo Nome

“E caiu Abrão sobre o seu rosto, e falou Deus com ele dizendo: Quanto a Mim, eis a Minha aliança contigo: serás o pai de muitas nações; e não se chamará mais o teu nome Abrão, mas Abraão será o teu nome; porque por pai de muitas nações te tenho posto”. Gên. 17:3-5.

O nome Abrão significa “Pai do alto”. O pai de Abrão era um pagão, e o nome pode ser referente ao culto pagão nos lugares altos. Mas agora uma sílaba é acrescentada, e torna-se Abraão, “Pai de muitas nações”. Na mudança de nome, nos casos de Abraão e Jacó, temos uma pista do novo nome que o Senhor concede a todos que são Seus. Ver Apo. 2:17; 3:12. “e chamar-te-ão por um nome novo, que a boca do Senhor designará”. Isa. 62:2.

Essa concessão de um novo nome a Abraão não indicava nenhuma mudança na promessa, mas era simplesmente um sinal a Abraão de que Deus levaria a sério o que havia dito. Seu nome daí em diante devia ser-lhe um constante lembrete da promessa. Alguns imaginam que a concessão desse novo nome assinalou uma mudança na natureza da promessa a ele feita; mas uma cuidadosa consideração da promessa, como anteriormente registrada, mostrará que isso não poderia dar-se. Abraão era exatamente o mesmo após o seu novo nome quanto era antes. Foi enquanto o seu nome era ainda Abrão que ele creu em Deus, e sua fé na promessa foi contada por justiça. Foi enquanto o seu nome era Abrão que Deus lhe pregou o Evangelho, dizendo: “Em ti todas as famílias da Terra serão abençoadas”.

Podemos não fazer qualquer distinção nas promessas de Deus a Abraão, dizendo que algumas delas foram temporárias, e somente para a semente carnal, e que outras foram espirituais e eternas. “Porque o Filho de Deus, Cristo Jesus, que entre vós foi pregado por nós . . . não foi sim e não; mas nEle houve sim. Porque, todas quantas promessas há de Deus, são nEle sim, é por Ele o Amém, para glória de Deus por nós.” 2 Cor. 1:19, 20. “Ora, as promessas foram feitas a Abraão e a seu descendente; não diz: E a descendentes, como falando de (65) muitos, mas como de um só: E a teu descendente, que é Cristo”. Gál. 3:16. Note que as promessas, não importa quantas são, todas vêm mediante Cristo. Observe também que o apóstolo fala de Abraão, e não de Abrão. Ele não diz que algumas foram feitas a Abrão, e outras a Abraão. E esse ponto é ainda mais enfático quando lemos as palavras de Estêvão, “O Deus da glória apareceu a nosso pai Abraão, estando na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã”. Atos 7:2. Embora ele fosse então conhecido como Abrão, a promessa era a mesma de quando ele era conhecido como Abraão. Cada referência a ele na Bíblia, mesmo as primeiras promessas, são com o nome Abraão. Este é o motivo pelo qual nos referimos a ele somente como Abrahão.

O Senhor continuou, após dizer a Abraão da mudança em seu nome, “E estabelecerei a minha aliança entre Mim e ti e a tua descendência depois de ti em suas gerações, por aliança perpétua, para te ser a ti por Deus, e à tua descendência depois de ti. E te darei a ti e à tua descendência depois de ti, a terra de tuas peregrinações, toda a terra de Canaã em perpétua possessão e ser-lhes-ei o seu Deus.” Gen. 17: 7 e 8.

Tomemos as diferentes partes desse concerto em detalhe. A sua parte central é a terra prometida, a terra de Canaã. É a mesma do capítulo 15. A promessa é de ser ela dada a Abraão e à sua semente. O concerto é o mesmo que foi feito ali; mas aqui o temos selado.

Notemos que é

Um “Pacto Perpétuo”

que o Senhor fez com ele. É o único concerto eterno, sobre o qual há tantas menções na Bíblia. É “pelo sangue da aliança eterna” que os homens são tornados perfeitos em toda boa obra para fazerem a vontade de Deus. Heb. 13:20. Ademais, a terra prometida nesse pacto perpétuo deveria ser

Uma “Possessão Perpétua”,

tanto para Abraão quanto para a sua semente. Perceba bem que o próprio Abraão, bem como sua semente, tiveram a promessa da terra como uma perpétua possessão. (66) Não se trata de uma herança que simplesmente vem a ser a possessão de sua família para sempre, mas tanto Abraão quanto a sua semente juntos deviam tê-la como uma perpétua possessão.

Todavia, uma terra pode ser mantida como uma perpétua possessão somente por aqueles que têm

Vida Eterna.

Portanto, nesse pacto encontramos a promessa de vida eterna. Não poderia ser doutro modo, porque, quando o pacto foi primeiro feito, como registrado no capítulo 15, foi dito a Abraão que teria que morrer antes que a terra lhe fosse dada como possessão; e Estêvão declarou que Deus não lhe deu o suficiente para pôr sobre ela o pé.4 Logo, só poderia ser sua através da ressurreição; e quando a ressurreição tiver lugar, então não mais haverá morte. Pois “seremos transformados; num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade, e que isto que é mortal se revista da imortalidade.” (I Cor. 15:51-53).

Assim, vemos que o estabelecimento desse pacto perpétuo com Abraão foi simplesmente a pregação do Evangelho eterno do reino, e a segurança a ele dada de uma parte nessas bênçãos. A promessa a Abraão foi uma promessa do Evangelho, e nada mais, e o pacto era a aliança eterna, da qual Cristo é o Mediador.5 Seu escopo é idêntico ao do novo concerto, no qual Deus diz, “porei as minhas leis no seu entendimento, e em seu coração as escreverei; Eu serei o seu Deus, e eles serão o Meu povo”. Heb. 8:10. Mas isso aparecerá mais plenamente ao prosseguirmos.

Um Pacto de Justiça

O Senhor disse a Abraão após esta reiteração do concerto com ele e sua semente, “E circuncidareis a carne do vosso prepúcio; e isto será por sinal da aliança entre Mim e vós”. Gên. 17:11. Agora, (67) se formos à Epístola aos Romanos aprenderemos muito mais do significado dessa transação. Precisamos ter as Escrituras perante nós a fim de podermos considerá-la de modo a entendê-la, assim a citaremos de modo extenso. “Que diremos, pois, ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne? Porque, se Abraão foi justificado pelas obras, tem de que se gloriar, mas não diante de Deus. Pois, que diz a Escritura? Creu Abraão em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça. Ora, àquele que faz qualquer obra não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida. Mas, àquele que não pratica, mas crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça. Assim também Davi declara bem-aventurado o homem a quem Deus imputa a justiça sem as obras, dizendo: Bem-aventurados aqueles cujas maldades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não imputa o pecado. Vem, pois, esta bem-aventurança sobre a circuncisão somente, ou também sobre a incircuncisão? Porque dizemos que a fé foi imputada como justiça a Abraão. Como lhe foi, pois, imputada? Estando na circuncisão ou na incircuncisão? Não na circuncisão, mas na incircuncisão. E recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé, quando estava na incircuncisão, para que fosse pai de todos os que crêem, estando eles também na incircuncisão; a fim de que também a justiça lhes seja imputada; E fosse pai da circuncisão, daqueles que não somente são da circuncisão, mas que também andam nas pisadas daquela fé que teve nosso pai Abraão, que tivera na incircuncisão. Porque a promessa de que havia de ser herdeiro do mundo não foi feita pela lei a Abraão, ou à sua posteridade, mas pela justiça da fé.” Rom. 4:1-13.

O tema do capítulo inteiro é Abraão e a justificação pela fé. O apóstolo toma o caso de Abraão como ilustração da verdade apresentada no capítulo precedente, ou seja, que um homem é tornado justo pela fé. A bênção que Abraão recebeu é a bênção dos pecados perdoados, mediante a justiça de Jesus Cristo. Ver versos 6-9. Portanto, quando lemos em Gên. 12:2, 3, que em Abraão todas as famílias da Terra seriam abençoadas, sabemos que a bênção referida é o perdão dos pecados. Isso pode ser positivamente comprovado por Atos 3:25, 26: “Vós sois os filhos dos profetas e da (68) aliança que Deus fez com nossos pais, dizendo a Abraão: Na tua descendência serão abençoadas todas as famílias da terra. Ressuscitando Deus a Seu Filho Jesus, primeiro O enviou a vós, para que nisso vos abençoasse, no apartar, a cada um de vós, das vossas maldades”.

Essa bênção veio a Abraão mediante Jesus Cristo e Sua cruz, tal como vem a nós. Pois “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-Se maldição por nós; . . . Para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios por Jesus Cristo, e para que, pela fé, nós recebamos a promessa do Espírito.”. Gál. 3:13, 14. Assim, descobrimos que as bênçãos do concerto com Abraão são simplesmente as bênçãos do Evangelho, e elas vêm a nós mediante a cruz de Cristo. Nada foi prometido nesse concerto, exceto o que há de ser obtido mediante o Evangelho; e tudo quanto o Evangelho contém estava nele.

A circuncisão foi concedida como um selo desse concerto. Mas a promessa, o concerto, a bênção, e tudo, vieram a Abraão antes que ele fosse circuncidado. Daí ele é o pai tanto dos incircuncisos quanto dos circuncisos. Judeus e gentios são igualmente participantes no concerto e suas bênçãos, desde que tenham a fé que Abraão teve.

Em Gên. 17:11 é-nos dito que a circuncisão foi dada como sinal do concerto que Deus estabeleceu com Abraão. Mas em Rom. 4:11 nos é dito que lhe foi dado como um selo de justiça que ele possuía pela fé. Em outras palavras, foi a garantia e o selo do perdão dos pecados mediante a justiça de Cristo. Portanto, sabemos que o concerto, do qual a circuncisão era o selo, foi um pacto de justificação pela fé; que todas as bênçãos prometidas nele o são sobre a base da justificação mediante Jesus Cristo. Isso novamente nos mostra que o concerto feito com Abraão era o Evangelho, e isso somente.

Uma Concessão de Terra

Mas nesse pacto a promessa central dizia respeito à terra. Toda a terra de Canaã foi prometida a Abraão e sua semente como (69) perpétua possessão. E então o selo do concerto, —circuncisão—foi dado, —um selo da justiça que ele tinha pela fé. Isso mostra que a terra de Canaã devia ser possuída somente pela fé. E aqui temos uma lição prática quanto à posse de coisas pela fé. Muitas pessoas pensam que uma coisa que é possuída pela fé é possuída somente na imaginação. Mas a terra de Canaã era um país real, e devia ser possuída de fato. A posse dela devia ser obtida, contudo, somente mediante a fé. Esse foi de fato o que se passou. Pela fé o povo cruzou o rio Jordão, e “pela fé caíram os muros de Jericó, após terem sido rodeados por sete dias”. Mas sobre isso trataremos mais adiante.

A terra de Canaã, que foi prometida no concerto, devia ter sido mantida mediante a justificação pela fé, o que foi selado pela circuncisão, o selo do concerto. Leiamos agora Rom. 4:13 uma vez mais, e veremos o quanto esteve envolvido nesta promessa. “Porque a promessa de que havia de ser herdeiro do mundo não foi feita pela lei a Abraão, ou à sua posteridade, mas pela justiça da fé”. Essa justificação de fé, nos é dito no verso 11, foi selada pela circuncisão; e a circuncisão era o selo do concerto que temos registrado em Gên. 17. Portanto, sabemos que a promessa da terra, que o concerto com Abraão continha, foi nada menos que a promessa da terra inteira. Ao chegarmos ao cumprimento da promessa, veremos mais plenamente como pode dar-se que a promessa da terra de Canaã incluía a posse da Terra inteira; mas o fato pode ser brevemente indicado abaixo.

O concerto em que a terra foi prometida, foi, como temos visto, um concerto de justiça. Sua base era a justificação pela fé. Era um concerto eterno, prometendo uma herança eterna tanto a Abraão quanto a sua semente, o que significou para eles vida eterna. Mas a graça reina mediante a justiça para a vida eterna somente através de Jesus Cristo, nosso Senhor. A vida eterna pode ser obtida somente em justiça. Ademais, uma vez que a promessa foi feita a Abraão, bem como a sua semente, e Abraão teve a garantia de que morreria muito antes da herança ser concedida, é evidente que somente poderia ser obtida mediante a ressurreição, que tem lugar quando da vinda (70) do Senhor, quando a imortalidade será concedida. Mas a vinda de Cristo se dá quando dos “tempos da restauração de todas as coisas, das quais Deus falou pela boca dos seus santos profetas, desde o princípio”. Atos 3:21. Portanto, concluímos que a herança da justiça, prometida a Abraão como uma perpétua possessão e que se daria através da ressurreição, quando da vinda do Senhor, era a “nova terra na qual habita a justiça”, a qual antecipamos segundo a promessa de Deus.

The Present Truth, 18 de junho de 1896.

Notas desta edição:

1) Abraão tinha setenta e cinco anos de idade quando partiu de Harã (Gên. 12:4), e a promessa foi primeiro tornada conhecida a ele antes de ter deixado a Mesopotâmia. Atos 7:2;

2) À margem da King James Version, a versão do rei Tiago.;

3) A Almeida fiel diz, no vs. 33, que “não eram de coração dobre”, isto é, fingido, traiçoeiro, dissimulado, enganador, hipócrita, etc...; e no vs. 38, “o mesmo coração”; Salmo 12:2 diz “Cada um fala com falsidade ao seu próximo; falam com lábios lisonjeiros e coração dobrado”, quer dizer, mentirosa, desonesta e fraudulentamente.

4) “E não lhe deu nela herança, nem ainda o espaço de um pé”, Atos 7:5;

5) Ver Heb. 8:6; 9:15; 12:24;