domingo, 22 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 40

300

As Promessas Para Israel

“Outro dia”

(Parte 1)

“Porque, se Josué lhes houvesse dado descanso, não falaria, depois disso, de outro dia. Portanto, resta ainda um repouso para o povo de Deus” (Heb. 4: 8 e 9).

Temos visto que conquanto nenhuma palavra das promessas de Deus a Israel haja falhado, “a palavra da pregação nada lhes aproveitou, porquanto não estava misturada com a fé, naqueles que a ouviram” (Heb. 4:2), e que, um longo tempo após o Senhor ter-lhes dado descanso, Ele lhes propôs, mediante Josué, as condições pelas quais poderiam desfrutar a herança.

O Reino do Senhor

Atravessando um período de mais de quatrocentos anos durante os quais a história dos filhos de Israel é um registro de apostasia e arrependimento e apostasia de novo, chegamos ao tempo de Davi, quando o reino de Israel alcançou o auge de seu poderio. Conquanto ao exigir um rei os filhos de Israel rejeitaram a Deus, Ele não os rejeitou. Não era desígnio de Deus que Israel tivesse jamais qualquer outro rei que não Ele próprio, mas eles não se contentaram em caminhar pela fé, tendo um Rei ao qual não podiam ver. Não obstante, o reino ainda permanecia sendo do Senhor e, portanto, Ele exercia o Seu direito a designar governantes.

(301) Assim mesmo se dá em todo o mundo. “A terra é do Senhor e sua plenitude”.1o Seu reino domina sobre todos”.2 As pessoas do mundo não O reconhecem como Rei, e se vangloriam em escolher seus próprios dirigentes, entretanto “o Altíssimo domina sobre o reino dos homens e o dá a quem quer”, “Ele remove os reis e estabelece os reis; Ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos” (Dan. 4:32 e 2:21). “não há autoridade que não venha de Deus; e as potestades que há foram ordenadas por Deus” (Rom. 13:1). Por isso cada alma devia sujeitar-se às “autoridades superiores”, que é evidência de que o reino do Senhor inclui a Terra inteira, conquanto os governantes, que, por um tempo, Ele permite imaginarem que estão mantendo as rédeas, e que se insubordinem contra Ele.

Estranhos e Vagueadores ao Tempo de Davi

Assim, quando na providência de Deus Davi chegou ao trono de Israel, “e tendo o Senhor lhe dado descanso de todos os seus inimigos em redor” (2º Sam. 7:1), estava em seu coração construir um templo ao Senhor. A princípio o profeta Natã, falando por suas próprias palavras, disse-lhe: “Vai e faze tudo quanto está no teu coração,”3 mas, posteriormente, ele falou a palavra do Senhor e disse que Davi não devia edificá-lo. Nesse tempo o Senhor disse a Davi:

“Também prepararei lugar para o Meu povo, para Israel, e o plantarei ali, para que habite no seu lugar, e não mais seja removido, e nunca mais os filhos da iniquidade o aflijam, como dantes, e desde o dia em que mandei que houvesse juízes sobre o Meu povo Israel; a ti, porém, te dei descanso de todos os teus inimigos; também o Senhor te faz saber que Ele te fará casa” (2º Sam. 7:10, 11).

O povo de Israel, portanto, não havia ainda obtido o descanso e a herança. Davi era um rei poderoso, e tinha “um grande nome, como o de grandes homens que habitam na Terra”,4 contudo quando transferiu o reino, com todo o material para a edificação do templo ao seu filho Salomão, ele disse em sua oração a Deus: “somos estrangeiros diante de Ti e peregrinos, como o foram todos os nossos pais; como a sombra são os nossos dias sobre a terra, e não há permanência” (1º Crô. 29:15).

(302) Por ocasião de quando a nação de Israel era grande e poderosa como jamais tinha sido sobre a Terra, o rei declarou-se tanto um estrangeiro e peregrino na terra como fora Abraão, que nela não possuía “nenhuma herança nela, nem mesmo para apoiar o seu pé.5 Davi na sua casa de cedro, bem como Abraão, Isaque e Jacó que habitavam em tendas “peregrinaram na terra da promessa como num país estranho”.6 Não só Abraão, Isaque e Jacó, mas Gideão, Sansão, Jefté, Davi, Samuel, e os profetas com muitos outros, “tendo recebido bom testemunho pela fé, contudo não alcançaram a promessa” (Heb. 11:32-39). Que evidência mais forte poderia haver de que a herança que Deus prometeu a Abraão e a sua semente nunca foi uma posse temporal neste “presente mundo mau”?7

A Jerusalém Temporal Significa Escravidão

Uma vez que o rei Davi no auge do seu poder não havia recebido a promessa, que completa loucura é supor que a promessa de restaurar Israel a sua própria terra poderá ser cumprida por qualquer retorno dos judeus à velha Jerusalém. Aqueles que estão edificando suas esperanças sobre a “Jerusalém atual”8 estão perdendo toda a bênção do evangelho. “Não recebemos o espírito de escravidão novamente para temer”,9 portanto não depositaremos confiança em nada que se ligue à velha Jerusalém; pois a “Jerusalém atual” “é escrava com seus filhos. Mas a Jerusalém que é de cima é livre; a qual é nossa mãe” (Gál. 4:25, 26). Quando a promessa for cumprida e o povo de Israel realmente possuir a terra, não mais sendo estrangeiros e peregrinos nela, seus dias não mais serão como uma sombra, mas nela habitarão para sempre.

Contudo, “O Senhor não retarda a Sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; porém é longânimo para convosco, não querendo que ninguém se perca, senão que todos venham a arrepender-se” (2ª Ped. 3:9). Temos salvação na “longanimidade de nosso Senhor” (vs. 15). Mesmo nos dias de Moisés, o tempo da promessa estava próximo, Atos 7:19, mas o povo não a recebeu. Preferiram este presente mundo mau, antes que o mundo do porvir. Mas Deus jurou por Si mesmo que a semente (303) do fiel Abraão nela entraria, e visto “restar que alguns entrem nele, e que aqueles a quem anteriormente foram pregadas as boas novas não entraram por causa da desobediência, determina outra vez um certo dia, Hoje, dizendo por Davi, depois de tanto tempo, como antes fora dito: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações” (Heb. 4:6, 7).

A descrença de Deus não pode anular a promessa de Deus. Rom. 3:3. “Se somos infiéis, Ele permanece fiel; porque não pode negar-se a Si mesmo” (2ª Tim. 2:13). Se nenhuma única alma dos descendentes naturais de Abraão e Jacó se revelasse filho de Abraão, mas fossem todos filhos do diabo, João 8:39-44, a promessa de Deus à semente de Abraão, Isaque, Jacó seria cumprida ao pé da letra, pois Deus é capaz de fazer das pedras do chão filhos de Abraão, Mat. 3:19. Isto seria simplesmente a repetição do que Ele fez no início, quando criou o homem do pó da terra. Se Josué lhes tivesse concedido descanso, então logicamente não teria havido necessidade de qualquer outro dia de salvação; mas a infidelidade dos professos seguidores de Deus retardou o cumprimento, e assim Deus em Sua misericórdia concede outro dia, e esse é “Hoje”.10 “Eis aqui agora o tempo aceitável, eis aqui agora o dia da salvação” (2 Cor. 6:2). “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações”.10

“Hoje”

Apenas pensem nisso! Mesmo quando Davi vivia, é chamado de “após tanto tempo”.11 Foi de fato um “longo tempo”, quinhentos anos completos após a promessa ter podido cumprir-se; contudo, após tempo ainda mais longo o Senhor oferece “outro dia”. Esse outro dia é hoje; não nos é concedido um ano no qual aceitar a oferta de salvação, nem o próximo mês, nem a próxima semana, nem mesmo o amanhã, mas somente hoje. Esse é todo o tempo que Deus nos tem dado — o tempo de graça dura apenas um dia. Com que maior vigor, portanto, as palavras nos chegam após tanto tempo. “Hoje”, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações”.10 Que glorioso tesouro Deus nos tem dado hoje, — a oportunidade (304) de adentrar os portais da justificação. Cristo é a porta, e por Ele todos podem entrar no tempo ainda chamado hoje. Não o aceitaremos como “o dia que o Senhor fez”12 e “nos alegraremos e nos regozijaremos nele? “A voz de regozijo e salvação está nos tabernáculos do justo”;13 “porque somos feitos participantes de Cristo, se mantivermos firmes o princípio de nossa confiança até o fim”.14 “Pois assim diz o Senhor Deus, o Santo de Israel: Voltando e descansando, sereis salvos; no sossego e na confiança estará a vossa força”. (Isa. 30:15).

Esse descanso é anunciado no Evangelho, pois Cristo diz: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que Sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas. Porque o Meu jugo é suave, e o Meu fardo é leve” (Mat. 11:28-30). O povo de Israel no tempo passado falhou em obter tal descanso, não porque deixou de lhe ser oferecido, mas porque quando o Evangelho lhes foi pregado não creram; o evangelho que agora nos é pregado é o mesmo que lhes foi pregado, Heb. 4:2.

O descanso está todo preparado “porque nós, os que temos crido, é que entramos no descanso, tal como disse: Assim jurei15 na Minha ira: Não entrarão no Meu descanso”.16 Deus jurou por Si mesmo que a semente de Abraão — aqueles que têm esta fé — entraria no descanso; e isso foi equivalente a um juramento de que os que não cressem não entrariam nele, portanto, Deus na verdade jurou que os destituídos de fé nEle (305) não entrariam. Esse não foi um decreto arbitrário, mas uma declaração de fato, pois é tão impossível que uma pessoa descrente entre no descanso como seria para um homem viver e crescer com vigor sem comer, beber ou respirar.

O fato de que “não puderam entrar por causa da incredulidade”;17 mostra que teriam entrado se tivessem crido; e o fato de que o perfeito descanso estava inteiramente pronto para eles, é adicionalmente demonstrado pela declaração, “as suas obras estivessem acabadas desde a fundação do mundo” (Heb. 4:3). Quando as obras estão concluídas, deve-se seguir o descanso; e nesse sentido lemos que “descansou Deus, no sétimo dia, de todas as Suas obras” (vs. 4). Isso é o que Deus disse num lugar do sétimo dia; mas noutro lugar disse: “Não entrarão no Meu descanso” (vs. 5). vemos, portanto, que o descanso que estava pronto, e no qual os filhos de Israel não entraram por causa da descrença, foi o descanso ligado ao sétimo dia. Pois foi o descanso divino que lhes fora oferecido, e foi o Seu descanso que eles falharam de confirmar, e o sétimo dia é o sábado — o descanso — do Senhor; é o único descanso sobre que lemos em ligação com Deus — Ele descansou no sétimo dia de toda a Sua obra,18 — e esse descanso estava pronto tão logo a obra da Criação foi completada.

A Obra de Deus E o Descanso de Deus

O descanso que é prometido é o descanso de Deus. O descanso segue-se ao labor, mas não até que este esteja terminado. Um homem não pode descansar de determinado trabalho até que este tenha sido concluído. A obra de Deus é a criação, uma obra completa, perfeita; “E viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. E foi a tarde e a manhã, o dia sexto. Assim foram acabados os céus e a terra, com todo o seu exército. Ora, havendo Deus completado no dia sétimo a obra que tinha feito, descansou nesse dia de toda a obra que fizera. Abençoou Deus o sétimo dia, e o santificou; porque nele descansou de toda a Sua obra que criara e fizera” (Gên. 1:31; 2:1-3).

(306) A obra era perfeita — tão boa quanto o próprio Deus poderia realizá-la, tão perfeita quanto perfeito é Ele, — e foi tudo feito; portanto, o descanso também era perfeito. Não havia qualquer mancha de maldição; era descanso absoluto, puro, sem mistura. Deus considerou a Sua obra, e nada havia que O levasse a arrepender-Se; nada a induzi-Lo a dizer, “Se eu tivesse que realizá-la outra vez ... ”; não havia lugar para alteração ou emenda; Ele estava perfeitamente satisfeito e deleitado com o que havia realizado. Oh, que língua ou pena pode descrever, ou que mente imaginar, o senso de ilimitada satisfação, a deliciosa paz e conteúdo que deve, necessariamente, seguir-se a toda obra executada e bem executada! Esta terra não comporta tal regozino, pois

“Trabalhe com o zelo que investir,

Algo ainda permanece sem fazer,

Algo incompleto ainda

Aguarda o amanhecer”19

mas toda essa doce satisfação e delicioso repouso Deus desfrutou num grau muito maior do que a mente humana possa imaginar, na medida em que Deus é maior do que o homem, naquele sétimo dia quando Deus descansou de toda a Sua obra.18

O Descanso no Qual Adão Entrou

Esse incomparável descanso é o que Deus concedeu ao homem no começo. “Tomou, pois, o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e guardar” (Gên. 2:15). “Éden” significa deleite, prazer, o jardim do Éden é o jardim do deleite; a palavra hebraica que neste lugar é vertida como “pôs” é um termo que tem o sentido de descanso; é a palavra da qual o nome próprio Noé deriva (para o significado, ver Gên. 5:29).; portanto, devemos ler Gên. 2:15 assim: “E o Senhor Deus tomou o homem e o levou a repousar no jardim de deleite para o lavrar e o guardar”.

O homem entrou no descanso porque entrou na obra perfeita, acabada, de Deus. Ele era obra de Deus, criado em Cristo Jesus (307) para as boas obras, as quais Deus havia anteriormente preparado a fim de caminhasse nelas.20 “A obra de Deus é esta: Que creiais” (João 6:29), e foi unicamente pela fé que Adão podia desfrutar a obra de Deus e compartilhar de Seu descanso; pois tão cedo ele duvidou de Deus, tomando no lugar a palavra de Satanás, perdeu tudo. Ele não tinha poder em si mesmo, pois era somente pó da terra, e somente podia reter o seu descanso e a sua herança na medida em que permitisse que Deus operasse nele “tanto o querer como o efetuar, segundo a Sua boa vontade”.21

“Nós, os que temos crido, é que entramos no descanso”,22 porque “a obra de Deus é esta: que creiais”.23 As duas declarações não são contraditórias, e sim idênticas em seu significado, porque a obra de Deus, que é nossa pela fé, é obra completa, e, portanto, entrar nessa obra é entrar no descanso. O descanso de Deus, portanto, não é vadiagem nem preguiça. Cristo declarou: “Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também” (João 5:17), contudo, “o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos confins da terra, não Se cansa nem Se fatiga” (Isa. 40:28). Ele atua por Sua palavra para suster aquilo que criou no princípio, de modo que os que hão crido em Deus, e entraram, pois, no descanso, são exortados a procurar “aplicar-se às boas obras” (Tito 3:8); mas sendo que essas boas obras são obtidas pela fé, e “não em virtude de obras de justiça que nós houvéssemos feito” (vs. 5), assim devem ser mantidas pela fé; mas a fé concede descanso, e, portanto, o descanso de Deus é compatível com a maior atividade, e dela necessariamente acompanhado.

The Present Truth, 4 de fevereiro de 1897.

Notas desta edição:

1) Salmo 24:1;

2) Salmo 103:19;

3) 2º Sam. 7:3;

4) 2º Sam. 7:9;

5) Atos 7:5;

6) Hebreus 11:6, Tradução literal de Young;

7) Gálatas 1:4;

8) Gálatas 4:25;

9) Romanos 8:15;

10) Hebreus 3: 7 e 8;

11) Josué 23: 1;

12) Salmo 118:24;

13) Salmo 118:15, KJV;

14) Hebreus 3:14;

15) Nota do autor: Num juramento há duas partes — a condição, e a consequência caso essa condição não seja cumprida. Por exemplo, um homem jura, “Eu pagarei mil libras, se não salvar esse homem da prisão”. Ou, “eu juro que não permitirei que o prisioneiro escape”. A epístola de Hebreus é muito concisa, e nos dá a condição, sem indicar a consequência em ligação com o juramento. Cada um pode preencher todos os terríveis resultados que a sua imaginação possa retratar caso Deus quebre a Sua palavra. Quando Deus jura por Si mesmo, Ele realmente está jurando a perda de Sua própria existência — se as coisas se desenvolverem contrariamente a Sua palavra; mas essa alternativa horrível não será declarada porque está além do limite da possibilidade. Portanto, sempre devemos ler esta expressão, onde quer que ocorra, como consta da Versão Revisada: “Como Eu juro em minha ira, não entrarão no Meu descanso”.

16) Hebreus 3:11; 4:3, 5; Salmo 95:11;

17) Hebreus 3: 19. Outra versão diz, “não entraram por causa da desobediência”;

18) Gên. 2:3;

19) Primeira estrofe do poema “Something Left Undone” (Algo Deixado Sem Fazer), do poeta americano Henry Wadsworth Longfellow (1807 – 1882);

20) Efésio0s 2: 10;

21) Filipenses 2: 13;

22) Hebreus 4:3;

23) João 6:29;