domingo, 22 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 36

261

As Promessas Para Israel

Vanglória e Derrota

“Tu estás em pé pela fé. Então não te ensoberbeças, mas teme” (Rom. 11:20).

“Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia” (1ª Cor. 10:12).

Um homem nunca está em maior perigo do que quando acaba de realizar algo de grande êxito, ou tenha obtido uma grande vitória. Se ele não estiver bem alerta, seu cântico de gratidão poderá ter um coro de auto-congratulação vangloriosa. Começando com o reconhecimento do poder de Deus, e louvor e gratidão por isso, o homem insensivelmente coloca-se no lugar de Deus, e presume que sua própria sabedoria e força o conduziram ao sucesso e à vitória. Assim, ele se expõe a ataque quando está seguro de vencer, uma vez que se separou da fonte do poder. Somente no Senhor Jeová há força perpétua.

“Enviando, pois, Josué, de Jericó, alguns homens a Ai, que está junto a Bete-Áven do lado Oriente de Betel, e falou-lhes dizendo: Subi, e espiai a terra. Subiram, pois, aqueles homens, e espiaram a Ai. E voltaram a Josué, e disseram-lhe: Não suba todo o povo; subam uns dois ou três mil homens, a ferir a Ai; não fatigues ali a todo o povo, porque os habitantes são poucos. Assim, subiram lá, do povo, uns três mil homens, os quais (262) fugiram diante dos homens de Ai. E os homens de Ai feriram deles uns trinta e seis, e os perseguiram desde a porta até Sebarim, e os feriram na descida; e o coração do povo se derreteu e se tornou como água” (Josué 7: 2-5).

Ninguém Livre de Perigo

A história de Jericó e Ai é suficiente para responder àqueles que repetem com tanta segurança como se fosse das Escrituras o dito popular, “uma vez na graça, sempre na graça”, no sentido de que se uma pessoa uma vez esteja realmente caminhando com Deus, nunca poderá cair. Não há dúvida de que os filhos de Israel confiavam real e plenamente no Senhor quando atravessaram o Jordão e marcharam ao redor de Jericó. Deus mesmo testemunhou que eles tinham a justificação pela fé, e Sua palavra declara que eles obtiveram uma gloriosa vitória mediante a fé. Não obstante, apenas poucos dias depois, sofreram uma séria derrota. Foi o começo da apostasia. Conquanto Deus posteriormente operasse muitas maravilhas por eles, e sempre Se revelasse pronto para fazer tudo quanto a fé deles podia captar, o povo inteiro de Israel nunca mais se revelou perfeitamente unido para “combater o bom combate da fé”1. Somente por um curto período, após o derramamento do Espírito Santo no dia de Pentecoste, “era um coração a alma da multidão dos que criam”2. Mas que essa mesma união e força, em perfeita fé, será testemunhada novamente entre o povo de Deus sobre a Terra é tão segura quanto a promessa de Deus.

A Causa da Derrota

Havia pecado no acampamento quando Israel subiu contra Ai, e essa foi a causa de sua derrota. O povo inteiro sofreu, não simplesmente por causa do pecado de Acã, mas porque todos haviam pecado. Eis que a sua alma está orgulhosa, não é reta nele; mas o justo pela sua fé viverá” (Hab. 2:4). Independente de terem sido cegados pelo “engano do pecado,”3 e então se tornarem exaltados em suas mentes, ou (263) se foi o caso de sua exaltação própria tê-los conduzido ao seu pecado, não importa, o certo é que o povo havia dado lugar ao pecado, e tornara-se autoconfiante, o que em si próprio é pecado.4 Devido ao pecado, sofreram derrota; na medida em que o pecado ganhou espaço em seus corações, não podiam prosseguir com a conquista da terra; e isso uma vez mais prova que a herança prometida, à qual Deus os estava conduzindo, era de molde a ser possuída somente por pessoas justas—aquelas que tinham justificação pela fé.

Os homens que subiram para conhecer a terra induziram o povo a crer que apenas alguns poucos homens seriam necessários para capturar Ai, por tratar-se de uma pequena cidade. Mas eles não tinha base para tal pressuposição. É verdade, Ai não era do tamanho de Jericó, mas números nada têm a ver com a tomada daquela cidade. “Pela fé os muros de Jericó vieram abaixo”; e se os israelitas fossem somente metade, ou mesmo um décimo do seu tamanho, o resultado haveria de ser o mesmo. Era requerido o mesmo poder para tomar Ai quanto para a tomada de Jericó, ou seja, o poder de Deus, assumido pela fé. Quando os homens disseram que apenas uns poucos dentre o povo se fazia necessário para a captura Ai, presumiram que era a sua habilidade militar que lhes asseguraria a terra. Mas esse foi um tremendo equívoco. Deus lhes havia prometido conceder a terra, e isso não podia ser obtido a não ser como uma dádiva. O exército mais poderoso que o mundo jamais viu, provido das mais sofisticadas armas de guerra, não poderia tomá-la; enquanto uns poucos homens desarmados, vigorosos em fé e dando glória a Deus poderiam tê-la possuído facilmente. A força que toma o reino do céu não é a força das armas.

A Derrota Não Estava no Plano de Deus

Outra coisa que aprendemos da história de Ai é que Deus não tencionava que Seu povo jamais conhecesse derrota, ou que na ocupação da terra um único homem perdesse a vida. Num episódio de guerra, a perda de trinta e seis homens num assalto sobre uma cidade não seria considerada grande, mesmo se o assalto tivesse êxito; mas na tomada de posse da terra de Canaã foi um terrível retrocesso. A promessa era, “Todo lugar que pisar a planta do vosso pé, (264) vo-lo tenho dado”, e “Ninguém te poderá resistir” (Josué 1:3, 5), e agora eles mesmos tinham sido obrigados a fugir, com a perda de homens. A influência que a travessia do Jordão e a captura de Jericó teria para impressionar e impor respeito sobre os pagãos agora estava desfeita. Confiando em seu próprio poderio os israelitas haviam perdido o poder da presença de Deus, e demonstraram a sua própria fraqueza.

Os Meios de Defesa

O fato de que era inteiramente contrário ao plano de Deus que qualquer israelita perdesse a vida ao tomarem posse da terra prometida é adicionalmente revelado pelo que pode ser bem notado aqui-- que não era o Seu desígnio que tivessem que lutar pela posse da herança prometida. Já vimos que números e armas nada tiveram que ver com a tomada de Jericó, e que quando dependiam de suas armas, forças que em combate regular teriam sido amplamente suficientes, de nada valiam. Recordem também da maravilhosa libertação do Egito, com a derrocada do exército todo de Faraó, sem que uma única arma fosse levantada ou o emprego de qualquer poder humano, e que Deus conduziu o povo pela rota mais longa e difícil a fim de que não enfrentassem guerra (Êxo. 13:18), e então leiam a seguinte promessa:

Se disseres no teu coração: Estas nações são mais numerosas do que eu; como as poderei lançar fora? Delas não terás temor; antes lembrarte-ás do que o Senhor teu Deus fez a Faraó e a todos os egípcios; das grandes provas que viram os teus olhos, e dos sinais, e maravilhas, e mão forte, e braço estendido, com que o Senhor teu Deus te tirou: Assim fará o Senhor teu Deus a todos os povos, diante dos quais tu temes. E mais, o Senhor teu Deus mandará entre eles vespões, até que pereçam os ficarem e se esconderem de diante de ti. Não te espantes diante deles, porque o Senhor teu Deus está no meio de ti, Deus grande e terrível” (Deu. 7:17-21).

(265) Tal como o Senhor fez a Faraó e a todo o Egito, assim promete fazer com todos os inimigos que se postassem contra o progresso dos israelitas rumo à terra prometida. Mas os filhos de Israel não lançaram um único golpe para operar sua libertação do Egito e a derrota de todos os seus exércitos. Quando Moisés, quarenta anos antes, tinha tentado livrar Israel pela força física, falhou marcadamente, e foi obrigado a fugir em desgraça. Foi somente quando ele conheceu o evangelho como o poder de Deus para a salvação (*Rom. 1:16), que foi capaz de conduzir o povo sem qualquer temor da ira do rei. Esta é prova conclusiva de que Deus não planejou que eles lutassem pela posse da terra; e se não lutassem, logicamente não podiam perder qualquer dos seus em batalha. Leia mais adiante sobre a maneira em que Deus Se propôs dar-lhes a terra:—

Enviarei o Meu terror adiante de ti, destruindo a todo o povo aonde entrares, e farei que todos os teus inimigos te voltem as costas. Também enviarei vespões adiante de ti, que lancem fora os heveus, os cananeus e os heteus de diante de ti. Não os lançarei fora de diante de ti num só ano, para que a terra não se torne em deserto, e as feras do campo não se multipliquem contra ti. Pouco a pouco os lançarei de diante de ti, até que seja multiplicado e possuas a terra por herança” (Êxo. 23:27-30).

Quando Jacó, anos antes, jornadeou pela mesma terra, com sua família, “o terror de Deus foi sobre as cidades que estavam ao redor deles, e não seguiram após os filhos de Jacó” (Gênesis 35:5). “Quando eram poucos homens em número, sim, mui poucos, e estrangeiros nela; quando andavam de nação em nação, e dum reino para outro povo; Não permitiu que ninguém os oprimisse, e por amor deles repreendeu a reis, dizendo: Não toqueis os Meus ungidos, e não maltrateis os Meus profetas”. Sal. 105:12-15. Esse mesmo poder devia levá-los à terra, e rapidamente dar-lhes uma herança eterna nela, pois posteriormente o Senhor, lamentando a infidelidade deles disse:--

“Oh! Se o Meu povo me tivesse ouvido! Se Israel andasse nos Meus caminhos! Em breve Eu abateria os seus inimigos, e viraria a Minha mão contra os seus adversários. Os que odeiam ao Senhor (266) ter-se-lhe-iam sujeitado, e o seu tempo seria eterno” (Sal. 81:13-15).

Por que Ele Lutaram

“Mas os filhos de Israel lutaram ao longo de toda a sua existência nacional, e sob a direção divina também”, se argumentar. Isso é verdade patente, mas não prova, em absoluto, que fosse o propósito de Deus que lutassem. Não devemos esquecer que “suas mentes foram cegadas” 5 pela descrença, de modo que não puderam perceber o propósito de Deus para eles. Não apreenderam as realidades espirituais do reino de Deus, mas, em vez disso, contentaram-se com as sombras; e o mesmo Deus que suportou a sua dureza de coração no início, e Se empenhou por ensinar-lhes por sombras, quando não queriam chegar à substância, ainda permanecia com eles, compassivamente levando em conta as suas fraquezas. O próprio Deus os suportou, dada a dureza de seus corações, por terem uma pluralidade de esposas, e mesmo estabelecendo regras regulando a poligamia, mas isso não prova que Ele tivesse tal desígnio para eles. Bem sabemos que “ao princípio não foi assim” (*Mat. 19:8). Destarte, quando Jesus proibiu os Seus seguidores de lutar, seja na causa que for, Ele não introduziu nada novo, mais do que quando ensinou que o homem devia ter somente uma esposa e a ela se apegar enquanto vivesse. Ele estava simplesmente enunciando os primeiros princípios—pregando uma reforma integral.

Executando o Julgamento Escrito

Uma coisa, contudo, que nunca devia ser perdida de vista pelas pessoas que estão dispostas a citar as ordens divinas aos israelitas sancionando guerra, seja de defesa ou conquista, é o fato de que Deus nunca lhes disse para destruir qualquer daqueles cuja taça de iniquidade não estivesse repleta, e que irrevogavelmente rejeitavam o caminho da justiça. No fim deste mundo, quando chegar a ocasião para os santos possuírem (267) o reino, o juízo será dado aos santos do Altíssimo (Dan. 7:22), e os santos julgarão não somente o mundo, mas também os anjos. 1ª Cor. 6:2, 3. E também, como co-herdeiros com Cristo, terão parte na execução do juízo, pois lemos:

“Exultem os santos na glória, alegrem-se nas suas camas. Estejam na sua garganta os altos louvores de Deus, e espada de dois gumes nas suas mãos, para tomarem vingança dos gentios, e darem repreensões aos povos; para prenderem os seus reis com cadeias, e os seus nobres com grilhões de ferro; para fazerem neles o juízo escrito; esta será a honra para todos os santos. Louvai ao Senhor!” Sal. 149:5-9.

Uma vez que Cristo associa o Seu povo consigo mesmo no reino, tornando-os reis e sacerdotes, não é incompatível que os Seus santos, em ligação com Ele, e por Sua direta autoridade, executem justo juízo sobre os incorrigíveis ímpios, do que é para Ele o fazê-lo. E assim, quando nos lembramos que a libertação do Egito foi o começo do fim, e que Deus estava Se propondo a conceder a Seu povo então o mesmo reino que agora nos promete, e ao qual Cristo chamará os benditos quando vier, podemos entender bem que um povo justo poderia então, bem como no futuro, ser agentes da justiça de Deus. Mas essa não seria uma guerra de conquista, mesmo pela posse da terra prometida, e sim a execução do juízo. Não se deve esquecer, porém, que o próprio Deus pessoalmente dá as instruções quando tal juízo será executado, e não deixa os homens sem orientação em tais casos. Ademais, somente aqueles que são isentos de pecado podem executar juízo sobre pecadores.

Guerra Não É um Sucesso

Contudo, um fato mais deve ser recordado em ligação com esta questão de luta e posse da terra de Canaã, a herança prometida, e trata-se de que os filhos de Israel não a obtiveram com todos os seus combates. A mesma promessa que lhes foi dada permanece para nós; “Porque, se Josué lhes houvesse dado repouso, não falaria depois disso de outro dia” no qual buscá-lo e (268) encontrá-lo. Heb. 4: 1 e 8. A razão por não o terem obtido foi sua incredulidade, e por isso é que tiveram de lutar. Se tivessem crido no Senhor, tê-Lo-iam deixado desocupar a terra de seus habitantes inteiramente depravados, da maneira que havia Se proposto fazer. Nesse entretempo eles não estariam desocupados, mas teriam realizado a obra de fé que Deus lhes designara vigorosamente, e que deve, a seguir, chamar a nossa atenção.

-- The Present Truth, 7 de janeiro de 1897.

Notas desta edição:

1) 1ª Tim 6:12, “Milita a boa milícia da fé,” Almeida Fiel;

2) Atos 4:32;

3) Hebreus 3:13;

4) A inteligência desta frase de Waggoner sugere que: “não importa se foi o pecado que levou à exaltação própria, ou se foi o contrário, o certo é que o povo pecou;

5) 2ª Cor. 3:14, KJV; “os seus sentidos foram endurecidos,” Alm. Fiel.


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