domingo, 8 de agosto de 2010

O Concerto Eterno, Capítulo 25

O Concerto Eterno, Capítulo 25

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As Promessas a Israel

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Vida da Palavra

Os judeus acharam difícil crer nas palavras de Cristo, de que Ele lhes daria a comer a Si mesmo. Disseram: “Como pode esse Homem dar-nos de Sua carne para comer?”[1] Jesus repetiu a declaração até mais enfaticamente, e então disse: “O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita; as palavras que Eu vos disse são espírito e são vida”.

Se cada um deles pudesse ter comido da carne de Cristo ao Ele ali estar, e a carne que eles tinham pudesse ser substituída, de modo a que pudessem continuar comendo-a, levando-a a seus estômagos, e a assimilando, não teriam obtido benefício duradouro dela. Nenhum bem espiritual dela lhes resultaria. Isso é o que de fato já haviam feito, quando comeram do pão que procedia da vida que havia em Seu corpo; mas dele não haviam tirado proveito. Assim, se a reivindicação dos romanos fosse verdadeira, de que os sacerdotes têm o poder de transformar o pão na carne real de Cristo, não haveria proveito nisso. As pessoas poderiam comer dela, e permanecer tão ímpias quanto sempre. “A carne para nada aproveita; as palavras que Eu vos tenho dito são espírito e são vida” (João 6:63).

“Pela palavra do Senhor foram feitos os céus, e todo o exército deles pelo sopro da sua boca” (Sal. 33:6). “E disse Deus: Produza a terra relva, ervas que dêem semente, e árvores frutíferas que, segundo as suas espécies, dêem fruto que tenha em si a sua semente, sobre a [181] terra. E assim foi (Gên. 1:11). Toda vida vegetal é apenas a manifestação da vida da palavra do Senhor. A vida que havia em Sua palavra fez com que o grão crescesse no princípio, e a mesma vida tem feito ela crescer desde então. Portanto, todo o alimento que o homem tem para comer é o que procede da palavra de Deus. Não podemos ver a vida num grão de trigo, mas quando comemos o pão de que é feito, nós a experimentamos. Mas a força física que recebemos do alimento é somente a operação da palavra do Senhor. Agora, se não reconhecemos e aceitamos a Deus nisso, nada obteremos senão força física; mas se em tudo percebemos e confessamos a Deus, recebemos da Sua vida de justiça. Ele declara, “Reconhece-O em todos os teus caminhos, e Ele endireitará as tuas veredas” (Prov. 3:6).

Quando Deus dirige nossos caminhos, tais veredas serão retas; pois “quanto a Deus, o Seu caminho é perfeito” (Sal. 18:30). As pessoas que comeram do pão no deserto não criam no Senhor e não reconheceram Sua vida, e assim não obtiveram qualquer vida espiritual dele. Assim se deu com os filhos de Israel no deserto. “Porque não creram em Deus nem confiaram na Sua salvação. Contudo Ele ordenou às nuvens lá em cima, e abriu as portas dos céus; fez chover sobre eles maná para comerem, e deu-lhes do trigo dos céus” (Sal. 78:22-24). Destarte, conquanto estivessem de fato se alimentando da vida de Cristo, não receberam vida espiritual, dada a sua cega descrença. Na concessão do maná Deus estava oferecendo a mesma lição que Cristo deu à multidão no deserto, ou seja, de que a Sua palavra é vida, e que “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”[2].

O maná foi o teste de sua lealdade à lei de Deus, e especialmente ao Sábado como o selo dessa lei. Mas no maná eles estavam assimilando a Cristo, se somente se tivessem dado conta disso. Portanto, temos que aprender que se apenas permitirmos que Cristo habite em nossos corações pela fé em Sua palavra,—não só numa parte, mas nela toda, —Ele trará à nossa vida a observância de toda a lei, inclusive o Sábado. Cada palavra que procede da boca de Deus é necessária para as nossas vidas.

É costumeiro entre os cristãos dar graças toda vez que comem. Há tanta razão para dar graças quando bebemos, [182] ou quando recebemos qualquer outra bênção de Deus. “Em tudo dai graças; pois esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus com respeito a vós”[3]. O problema é que dar graças tantas vezes se constitui numa mera formalidade. É muitas vezes praticado por ter-se tornado um costume, não sendo procedente do coração. O que isso realmente significa? Apenas que nossa comida e bebida, e tudo que é necessário para a nossa vida, vêm de Deus. É tudo uma manifestação de Seu amor por nós. Mas sendo que “Deus é amor”, a manifestação de Seu amor é apenas a manifestação de Sua vida. Ao partilharmos dos benefícios do Seu amor, estamos de fato partilhando dEle. Agora, se continuamente reconhecermos e acatarmos isso, quer estejamos a comer ou beber, ou seja o que fizermos, tudo será feito para a glória de Deus. Viveremos como se estivéssemos em Sua direta presença. Sabendo que a Sua vida é justiça, e que a Sua palavra é a Sua vida, nossas graças pela comida serão de gratidão por Sua palavra.

Quem não pode ver que essa vida deve necessariamente ser uma vida justa? Com nossa alimentação diária devemos estar nos alimentando de Cristo, e assim, logicamente, de Sua justiça. É isso que Deus deseja que aprendamos do relato da concessão do maná. Era a vida deles, e se tivessem reconhecido a Cristo nela, a vida deles teria sido a justiça da lei. Mas nosso alimento diário procede de Deus tão certamente quanto o deles. Que aprendamos a lição que eles negligenciaram.

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Uma Lição de Igualdade

No relato da outorga do maná, encontramos a declaração muitas vezes repetida de que “cada um colheu tanto quanto podia comer”. Também lhes foi dito para colherem para aqueles que estavam nas tendas. “Assim o fizeram os filhos de Israel; e colheram uns mais e outros menos. Quando, porém, o mediam com o gômer, nada sobejava ao que colhera muito, nem faltava ao que colhera pouco; colhia cada um tanto quanto podia comer”. Êxo. 16:17, 18.

Há algo maravilhoso com respeito a isso. Parece como se houvesse um milagre no fato, e assim se dava, em certo sentido; mas o milagre não consistia em que uma quantidade maior de certo homem subitamente se reduzisse em [183] medida, e a medida de metade de outro homem misteriosamente se completasse. O Apóstolo Paulo nos ajuda a ter um entendimento disso. Escrevendo aos irmãos coríntios, com respeito ao dar, ele declarou: “Mas, não digo isto para que os outros tenham alívio e vós opressão, mas para que haja igualdade, suprindo, neste tempo presente, na vossa abundância a falta dos outros, para que também a abundância deles venha a suprir a vossa falta, e assim haja igualdade; como está escrito: Ao que muito colheu, não sobrou; e ao que pouco colheu, não faltou” (2 Cor. 8: 13-15).

O milagre foi o da graça de Deus em dar. Aquele que reuniu muito nada tinha de sobra; porque ele dividia com alguém mais que tinha pouco, ou que não tivesse sido capaz de colher nada; e assim aquele que colhera pouco não tinha carência. Assim descobrimos que ali no deserto ocorria o mesmo princípio que se manifestou na Igreja no dia do Pentecostes. “Da multidão dos que criam, era um só o coração e uma só a alma, e ninguém dizia que coisa alguma das que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns. Com grande poder os apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante graça. Pois não havia entre eles necessitado algum; porque todos os que possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam o preço do que vendiam e o depositavam aos pés dos apóstolos”. Atos 4:32-34.

Falamos muito das faltas dos antigos israelitas; é bom às vezes considerar o outro lado. Com todas as suas faltas, eles nada tinham de diferente do que é comum aos homens. Eles não eram piores do que as pessoas em geral são, e às vezes ascendiam a alturas de fé e confiança que raramente são vistas. Não devemos imaginar que sempre mantinham esta bondade e que não havia ambiciosos entre eles. Assim também se dava na Igreja, cuja história é narrada em Atos dos Apóstolos. Mas nos é suficiente saber o que fizeram pelo menos em parte do tempo, e saber que Deus os aprovava. Deus lhes deu pão em abundância. A parte deles era simplesmente colher. Não havia, portanto, razão nenhuma para não dividirem com seus irmãos necessitados. De fato, ao considerarmos a questão à distância, parece a coisa mais natural do mundo assim agir.

Mas a nossa condição não difere da deles. Nada temos exceto aquilo que procede do Senhor. Ele é quem tudo nos concede, e o máximo que podemos fazer é recolher as Suas bênçãos. Portanto, não devemos considerar qualquer de [184] nossas posses como sendo nossa, mas mantê-las somente em custódia para Ele. Mas observem que isso era muito diferente de todos os modernos esquemas de comunismo. Não era uma divisão de propriedade por lei, mas um dar diário de parte do forte para com o fraco. Ninguém reservava nada para o futuro, deixando outros destituídos de provisões para o presente, mas confiavam em Deus como provedor do dia-a-dia.

Esse tipo de comunismo não pode ser conseguido por quaisquer planos humanos. É o resultado do amor de Deus no coração. “Quem, pois, tiver bens do mundo, e, vendo o seu irmão necessitado, lhe cerrar as suas entranhas, como estará nele o amor de Deus?”[4]. ‘Porque já conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, por amor de vós Se fez pobre, para que pela Sua pobreza enriquecêsseis[5]. Essa graça e esse amor caracterizam o verdadeiro Israel.

- The Present Truth, 22 de outubro de 1896.



[1] João 6:52;

[2] Mat. 4:4;

[3] I Tess. 5:18;

[4] 1 João 3:17;

[5] 2 Cor. 8:9.